Um Dia Filme Quotes

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deus tem que ser substituído rapidamente por poe- mas, sílabas sibilantes, lâmpadas acesas, corpos palpáveis, vivos e limpos. a dor de todas as ruas vazias. sinto-me capaz de caminhar na língua aguçada deste silêncio. e na sua simplicidade, na sua clareza, no seu abis- mo. sinto-me capaz de acabar com esse vácuo, e de aca- bar comigo mesmo. a dor de todas as ruas vazias. mas gosto da noite e do riso de cinzas. gosto do deserto, e do acaso da vida. gosto dos enganos, da sorte e dos encontros inesperados. pernoito quase sempre no lado sagrado do meu cora- ção, ou onde o medo tem a precaridade doutro corpo. a dor de todas as ruas vazias. pois bem, mário - o paraíso sabe-se que chega a lis- boa na fragata do alfeite. basta pôr uma lua nervosa no cimo do mastro, e mandar arrear o velame. é isto que é preciso dizer: daqui ninguém sai sem cadastro. a dor de todas as ruas vazias. sujo os olhos com sangue. chove torrencialmente. o filme acabou. não nos conheceremos nunca. a dor de todas as ruas vazias. os poemas adormeceram no desassossego da idade. fulguram na perturbação de um tempo cada dia mais curto. e, por vezes, ouço-os no transe da noite. assolam-me as imagens, rasgam-me as metáforas insidiosas, porcas. ..e nada escrevo. o regresso à escrita terminou. a vida toda fodida - e a alma esburacada por uma agonia tamanho deste mar. a dor de todas as ruas vazias.
Al Berto (Horto de incêndio)
Hoje entendo bem meu pai. Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar do calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver. Não há como não admirar um homem – Cousteau, ao comentar o sucesso do seu primeiro grande filme: “Não adianta, não serve para nada, é preciso ir ver.” Il faut aller voir. Pura verdade, o mundo na TV é lindo, mas serve para pouca coisa. É preciso questionar o que se aprendeu. É preciso ir tocá-lo.
Amyr Klink
São os muros que fazem os ladrões. A coragem não é contagiosa; o medo, sim. A literatura é a maneira que um verdadeiro mentiroso tem para se fazer aceitar socialmente. A verdade é uma superstição. Deus deu-nos sonhos para que possamos espreitar o outro lado. A realidade é dolorosa e imperfeita, é essa a sua natureza e por isso a distinguimos dos sonhos. (...) A realidade fere, mesmo quando, por instantes, nos parece um sonho. Nos livros está tudo o que existe, muitas vezes em cores mais autênticas, e sem a dor verídica de tudo o que realmente existe. Entre a vida e os livros, meu filho, escolhe os livros. Imaginem um rapaz correndo de moto numa estrada secundária. O vento bate-lhe no rosto. O rapaz fecha os olhos e abre os braços, como nos filmes, sentindo-se vivo e em plena comunhão com o universo. Não vê o caminhão irromper do cruzamento. Morre feliz. A felicidade é quase sempre uma irresponsabilidade. Somos felizes durante os breves instantes em que fechamos os olhos. Existem pessoas que revelam, desde muito cedo, um enorme talento para a desventura. A infelicidade atinge-os como uma pedrada, dia sim, dia não, e eles recebem-na com um suspiro conformado. Outras há, pelo contrário, com uma estranha propensão para a felicidade. Estas são atraídas pelo azul, aquelas pela embriaguez dos abismos. A memória é uma paisagem contemplada de um comboio em movimento.
José Eduardo Agualusa
- Por sorte, esquisitos como ela são raros. Sabemos como podar a maioria deles quando ainda são brotos, no começo. Não se pode construir uma casa sem pregos e madeira. Se você não quiser que se construa uma casa, esconda os pregos e a madeira. Se não quiser um homem politicamente infeliz, não lhe dê os dois lados de uma questão para resolver; dê-lhe apenas um. Melhor ainda, não lhe dê nenhum. Deixe que ele se esqueça de que há uma coisa como a guerra. Se o governo é ineficiente, despótico e ávido por impostos, melhor que ele seja tudo isso do que as pessoas se preocuparem com isso. Paz, Montag. Promova concursos em que vençam as pessoas que se lembrarem da letra das canções mais populares ou dos nomes das capitais dos estados ou de quanto foi a safra de milho do ano anterior. Encha as pessoas com dados incombustíveis, entupa-as tanto com "fatos" que elas se sintam empanzinadas, mas absolutamente "brilhantes" quanto a informações. Assim, elas imaginarão que estão pensando, terão uma sensação de movimento sem sair do lugar. E ficarão felizes, porque fatos dessa ordem não mudam. Não as coloque em terreno movediço, como filosofia ou sociologia, com que comparar suas experiências. Aí reside a melancolia. Todo homem capaz de desmontar um telão de tevê e montá-lo novamente, e a maioria consegue, hoje em dia está mais feliz do que qualquer homem que tenta usar a régua de cálculo, medir e comparar o universo, que simplesmente não será medido ou comparado sem que o homem se sinta bestial e solitário. Eu sei porque já tentei. Para o inferno com isso! Portanto, que venham seus clubes e festas, seus acrobatas e mágicos, seus heróis, carros a jato, motogiroplanos, seu sexo e heroína, tudo o que tenha a ver com reflexo condicionado. Se a peça for ruim, se o filme não disser nada, estimulem-me com o teremim, com muito barulho. Pensarei que estou reagindo à peça, quando se trata apenas de uma reação tátil à vibração. Mas não me importo. Tudo que peço é um passatempo sólido.
Ray Bradbury (Fahrenheit 451)
A formação voou de costas sobre uma cidade alemã em chamas. Os bombardeiros abriram os alçapões das bombas e realizaram um magnetismo milagroso que encolheu os incêndios, reunindo-os em recipientes cilíndricos de aço e levantou os recipientes nos bojos dos aviões. Os recipientes arrumaram-se em prateleiras. Os alemães lá embaixo também tinham os seus artifícios milagrosos, que eram longos tubos de aço. Eram usados para aspirar mais fragmentos dos tripulantes e dos aviões. Mas, ainda assim, havia uns poucos americanos feridos e alguns dos bombardeiros estavam em mau estado. Sobre a França, porém, os aviões de combate alemães voltaram e consertaram tudo. • • • Quando os bombardeiros voltaram à sua base, os cilindros de aço foram retirados das prateleiras e mandados de volta aos Estados Unidos, onde havia fábricas funcionando noite e dia, desmontando os cilindros e separando o seu perigoso conteúdo em minerais. Um aspecto tocante era que o trabalho estava entregue principalmente a mulheres. Em seguida os minerais foram enviados a especialistas em lugares remotos. A função deles era enterrá-los no solo, escondê-los tão bem que jamais pudessem voltar a fazer mal a quem quer que fosse. Os aviadores americanos devolveram seus uniformes e se transformaram em estudantes. E Billy Pilgrim supôs que Hitler se transformou num bebê. Isto não estava no filme, mas Billy estava extrapolando. Todo o mundo se transformou em bebê, e a humanidade toda, sem exceção, conspirou biologicamente para produzir duas pessoas perfeitas, chamadas Adão e Eva. Foi o que Billy supôs.
Anonymous
(carta ao cabrão insensível) Meu grandessíssimo cabrão: Escrevo-te para te dizer que és um idiota da pior espécie. Um burgesso. Um monte de bosta. Um pedaço de asno. Poderia, por isso, ficar por aqui nesta missiva – até porque o mais importante já está dito. Mas prefiro explicar-te, pacientemente, porquê. Quando gostares de alguém não tenhas medo. Não sejas cobarde. Não sejas poucochinho. Não te escondas em semi-palavras, em semi-actos. Quando gostares de alguém, vai com tudo, vai contigo todo, com tudo o que és, com tudo o que sentes, com tudo o que tens para dar. Sê romântico, sê piroso, sê incansável, sê sonhador e faz sonhar. Sê utópico – porque não? Faz planos em conjunto, imagina em conjunto. Faz como nos livros, faz como nos filmes: não acredites na treta do impossível, na treta do improvável. Não acredites na treta de que o amor é treta. Essa é a mentira que os toscos inventaram para poderem ser toscos. Vai com quem amas até ao fim do mundo todos os dias. Até à última gota não é uma forma de vida; é a única forma de vida. O resto é merda. Diz que amas se amas. Mostra que amas se amas. “Sim: eu amo” – qual é dificuldade de dizer isto? “Sim: eu quero-te” – qual é a dificuldade de dizer isto? “Sim: eu preciso de ti” – qual é a dificuldade de dizer isto? É tão simples ser feliz por dentro do amor. Tão simples. Basta amar e não temer amar. Amar só dói quando não se ama – qual é a dificuldade de entender isto? Não te escondas de todos os lados de ti. Não vás na cantiga do macho latino, do macho que não está habilitado a sentir – e que por isso tem de ser, por fora, intocável, sempre sólido. Sólidos são os calhaus. Sólidos são os cubos de gelo – e até esses, quando começam a aquecer, se derretem todos. Não queiras ser um bruto só porque te impingiram que tens de ser um bruto. Os brutos tendem a sofrer brutalidades – e a fazer sofrer brutalidades. Os brutos não fazem falta nenhuma ao mundo de ninguém. Os brutos não fazem falta nenhuma ao mundo todo. Se sentes, vai. Se queres, tenta. Se te apetece, inventa. Se um livro te faz chorar: chora. Chora porque és gente, porque és pessoa, porque tens muito mais do que um corpo. Se um abraço te emociona, leva-te nessa emoção, contagia-te e contagia, vai até ao final dos ossos, até ao começo das veias. Se és homem sente – qual é a dificuldade de entender isto? Só não sente quem nem sequer é gente. Esquece os preconceitos. Esquece as frases que te inculcaram como se fossem leis universais. A sociedade que vá dar banho ao cão se por causa dela perdes o que tanto queres. Entre a tua saúde e a saúde da sociedade não hesites: escolhe a tua. A sociedade adapta-se. A sociedade adapta-se sempre. É isso a História da Humanidade, nada mais: as pessoas a escolherem a sua própria sanidade, a escolherem a sua própria felicidade – e a sociedade, diligente, a correr atrás. Não corras atrás dela; deixa que ela corra atrás de ti. E é se quer. Se não quiser deixa-a ficar e vai à tua vida. Vai à tua vida: eis o segredo, eis a fórmula. Vai à tua vida. Quatro palavras, quatro simples palavras, e está tudo dito. Vai à tua vida. Vai sempre à tua vida. É ela que te importa. É sobretudo ela que tem de te importar. A tua vida e a vida de todos aqueles eleitos que fazem parte dela. Trata dela. Trata deles. Concentra-te no que importa. Guarda as forças para o que importa. O resto é merda. Tudo isto para te dizer, talvez já te tenhas esquecido, que és um idiota da pior espécie. Um burgesso. Um monte de bosta. Um pedaço de asno. Creio que já percebeste porquê, certo? Não mereces, por isso, um único pedacinho do meu amor. Mas já o tens todo.
Pedro Chagas Freitas (Prometo Perder)
A cada dia eu sei de mais coisas sobre as quais nunca saberei, os livros que me fariam um ser humano melhor, os filmes que mudariam minha vida, a melhor de todas as músicas, que nunca ouvirei. Quanto mais estudo, mais descubro a vastidão da minha ignorância. Minha burrice é uma África, minha ingenuidade é uma Ásia, minha estupidez, três Américas. Já minha sabedoria, esta é uma ilha da Páscoa, um pingo de terra firme batido sem piedade pelas ondas da incerteza e fustigado pelos ventos da amnésia, a milhares de quilômetros de qualquer porto seguro, nem mesmo sei ao certo se 'a milhares de quilômetros' se escreve assim, ou se este a tem agá ou crase. Nada disso importa. Só o que importa são teus olhos, tua boca, teu colo, teu corpo, tua presença luminosa que prenuncia um futuro de prazer, de aconchego e de amores incondicionais. Tudo isso foi o que eu pensei, mais ou menos, quando ela sorriu. O que eu disse foi 'estou gostando do curso', bem mais curto.
Jorge Furtado (Trabalhos de Amor Perdidos (Devorando Shakespeare, #1))
Eu queria tanto te odiar, queria odiar você por cada dia em que eu pensava em te ligar, cada noite que eu virei acordado por não conseguir parar de pensar em você. Eu queria te odiar, porque o ódio não é um sentimento tão complexo. Mas eu não conseguia, porque quando eu pensava em você, eu lembrava de todas as vezes em que matamos aula para ir a praia, de cada filme que fomos ver no cinema, de você sussurrando que me amava, de todas as vezes em que eu entrei escondido no seu quarto.
GABBIE OLIVEIRA (NOSTALGIA (Volume 1) (Portuguese Edition))
020-"A 'Justiça', no sistema capitalista, foi construída pelas elites que se utilizaram da injustiça para beneficiarem a si própria.(Jocax)" 019-"A religião escraviza a mente e deturpa a forma de pensar. (jocax)" 018-"A forma de o crente lidar com as contradições religiosas é adotar dois pesos e duas medidas, única forma de conviver em seu mundo contraditório. (jocax)" 017-"A Onisciência é como um filme de rolo: as coisas já estão gravadas na película e nada poderá mudar a historia do filme" (Jocax) 016-"Enquanto a maioria sonha com um paraíso irreal, outros poucos vivem no paraíso real, gerado e mantido pelo suor e ilusão daqueles que sonham." (Jocax) 015-"Confundir o marxismo com as atrocidades cometidas por tiranos que dizem segui-lo é equivalente a afirmar que o catolicismo que engendrou os genocídios hitlerianos.(jocax)" 014-"As Privatizações generalizadas são um Auto Atestado de incompetência administrativa (ou uma forma de roubar o patrimônio público). (jocax)" 013-"O Nada Jocaxiano é a mais racional explicação para a origem do universo. (jocax)" 012-"Não é a crença em Deus que faz o caráter de uma pessoa mas, principalmente, seus genes. (jocax)" 011-"Um dia descobrirão que a justiça se faz através da maximização da felicidade global, como propõe a meta-ética-cientifica. Até que isso aconteça toda ética, direito, e justiça serão baseados em valores relativos, sujeito a todo tipo de manipulação e subjetividade. (jocax)
jocax
O Joker tinha-se efetivamente tornado um rei e vivia numa casa dourada no céu. Os cidadãos procuravam clichés e faziam por recordar que ainda havia pássaros nas árvores e o céu não tinha desabado e ainda era, muitas vezes, azul. A cidade continuava de pé. E no rádio e nas aplicações de música que soavam nos auscultadores Bluetooth dos jovens descuidados, a vida continuava. Os Yankees continuavam a estar preocupados com a sua rotação de lançamento, os Mets continuavam a fazer fraca figura e os knicks continuavam a estar condenados pela maldição de serem os knicks. A Internet continuava cheia de mentiras e o negócio da verdade estava falido. Os melhores tinham perdido toda a convicção e os piores estavam repletos de uma intensidade apaixonada e a fraqueza dos justos era revelada pela ira dos injustos. Mas a República conservava-se mais ou menos intacta. Permitam-me que o deixe aqui expresso, porque era uma afirmação muitas vezes feita para consolar aqueles de nós que não eram fáceis de consolar. De certo modo é uma ficção, mas eu repito-a. Sei que depois da tempestade vinha outra tempestade, e outra ainda. Sei que o mau tempo vai estar nas previsões meteorológicas para sempre e que os dias felizes não estão de volta e que a intolerância é o que está na moda e o sistema está na realidade viciado, mas não como o palhaço maligno nos tentou fazer crer. Às vezes os maus ganham, e que se faz quando o mundo em que se acredita se revela uma lua de papel e surge um planeta escuro que diz “Não. O mundo sou eu.” Como vivemos no seio dos nossos compatriotas quando não sabemos quais deles se contam entre os mais de sessenta milhões que puseram o horror no poder, quando não podemos distinguir quem figura entre os noventa milhões que encolheram os ombros e ficaram em casa, ou quando os nossos concidadãos nos dizem que saber coisas é elitista e detestam as elites, e tudo aquilo que sempre tivemos é a nossa mente e fomos criados na crença do encanto do conhecimento, não aquele disparate do conhecimento-é-poder, mas sim o conhecimento é beleza, e depois tudo isso, a educação, a arte, a música, os filmes, se torna uma razão para ser abominado, e a criatura surgida do Spiritus Mundi se ergue e avança indolentemente em direção a Washington, DC, para nascer. O que fiz foi recolher-me à vida privada- agarrar-me à vida como a conhecera, ao seu quotidiano e à sua força, e insistir na capacidade do universo moral dos Jardins de sobreviver até ao mais feroz dos ataques. E agora, por conseguinte, deixem a minha história ter os seus momentos derradeiros, no meio do macrolixo que possa haver à volta de lerem isto, seja a manufactrovérsia, qualquer que seja o horror ou a estupidez ou fealdade ou vergonha. Deixem-me convidar o gigantesco rei do cabelo verde de banda desenhada vitorioso, com os seus direitos cinematográficos de um bilião de dólares, a sentar-se no banco traseiro e deixar que sejam as pessoas reais a conduzir o autocarro. As nossas pequenas vidas são talvez a única coisa que logramos compreender...
Salman Rushdie (The Golden House)
– Como está indo o seu seminário sobre desastres de carros? – Já examinamos centenas de colisões. Carros com carros. Carros com caminhões. Caminhões com ônibus. Motos com carros. Carros com helicópteros. Caminhões com caminhões. Meus alunos acham que esses filmes são proféticos. Que ilustram a tendência suicida da tecnologia. O impulso de suicidar-se, a sede incontrolável de suicídio. – O que você diz a eles? – De modo geral, são filmes classe B, feitos para a televisão, para passar em autocines do interior. Digo aos meus alunos que não devem procurar o apocalipse nesses filmes. Vejo esses desastres como parte de uma velha tradição de otimismo norte-americano. São eventos positivos, afirmativos. Cada desastre tenta ser melhor que o anterior. Há um aperfeiçoamento constante de instrumentos e perícia, desafios enfrentados. O diretor diz: “Quero uma jamanta virando duas cambalhotas e produzindo uma bola de fogo alaranjada com diâmetro de doze metros que dê para iluminar a cena”. Digo aos meus alunos que, se eles querem pensar em termos de tecnologia, têm que levar isso em conta, essa tendência a realizar atos grandiosos, a correr atrás de um sonho. – Um sonho? E como seus alunos reagem? – Igualzinho a você. “Um sonho?” Tanto sangue, vidro quebrado, borracha cantando? Tanto desperdício, tantos indícios de uma civilização em decadência? – E aí? – Aí eu lhes digo que o que eles estão vendo não é decadência, e sim inocência. O filme deixa de lado a complexidade das paixões humanas para nos mostrar uma coisa fundamental, cheia de fogo, barulho e ímpeto. É uma realização conservadora de desejos, uma ânsia de ingenuidade. Queremos voltar à pureza. Queremos voltar para trás na trajetória da experiência da sofisticação e das responsabilidades que ela implica. Meus alunos dizem: “Veja quantos corpos esmagados, membros amputados. Que raio de inocência é essa?”. – E o que você diz a eles? – Que não consigo encarar um desastre de carros num filme como um ato violento. É uma comemoração. Uma reafirmação de valores e crenças tradicionais. Eu associo esses desastres a feriados nacionais, como o Dia de Ação de Graças e o Dia da Independência. Nós não choramos os mortos nem celebramos milagres. Vivemos numa era de otimismo profano, de autocelebração. Vamos melhorar, prosperar, nos aperfeiçoar. Veja qualquer cena de desastre de carro de filme americano. É um momento de alegria, como uma cena de equilibrismo, de corda bamba. As pessoas que criam esses desastres conseguem captar uma serenidade, um prazer ingênuo do qual os acidentes de carro dos filmes estrangeiros não chegam nem perto. – O negócio é enxergar além da violência. – Justamente. Enxergar além da violência, Jack. E ver esse espírito maravilhoso de inocência e ludismo.
Don DeLillo (White Noise)
Uma das abordagens mais premonitórias do lugar do espectral em um mundo iluminado, sem dia ou noite, é o filme Solaris, de Andrei Tarkóvski, de 1972.
Jonathan Crary (24/7: Capitalismo tardio e os fins do sono (Coleção Exit) (Portuguese Edition))