“
Não te amo como se fosse rosa de sal,topázio
ou flecha de cravos que
propagam o fogo:
te amo como se amam certas coisas obscuras,
secretamente,entre a sombra e a alma.
Te amo como a planta que não
floresce e leva
dentro de si,oculta, a luz daquelas flores,
e graças a
teu amor vive escuro em meu corpo
o apertado aroma que ascendeu da terra.
Te amo sem saber como,nem quando,nem onde,
te amo diretamente sem
problemas nem orgulho:
assim te amo porque não sei amar de outra maneira,
senão assim deste modo em que eu não sou nem és
tão perto que tua
mão sobre meu peito é minha
tão perto que se fecham meus olhos com meu
sonho.
”
”
Pablo Neruda
“
Ser ou estar. Não, não é ser ou não ser, essa já existe, não confundir com a minha que acabei de inventar agora. Originalíssima. Se eu sou, não estou porque para que eu seja é preciso que eu não esteja. Mas não esteja onde? Muito boa a pergunta, não esteja onde. Fora de mim, é lógico. Para que eu seja assim inteira (essencial e essência) é preciso que não esteja em outro lugar senão em mim. Não me desintegro na natureza porque ela me toma e me devolve na íntegra: não há competição mas identificação dos elementos. Apenas isso. Na cidade me desintegro porque na cidade eu não sou, eu estou: estou competindo e como dentro das regras do jogo (milhares de regras) preciso competir bem, tenho consequentemente de estar bem para competir o melhor possível. Para competir o melhor possível acabo sacrificando o ser (próprio ou alheio, o que vem a dar no mesmo). Ora, se sacrifico o ser para apenas estar, acabo me desintegrando (essencial e essência) até a pulverização total.
”
”
Lygia Fagundes Telles (As Meninas)
“
– O que você usou? Eu quero também.
– Eu sou assim.
”
”
Filipe Russo (Caro Jovem Adulto)
“
― Por quê?!
― Porque eu sou assim.
― Assim como?!
― Desse jeito.
”
”
Filipe Russo (Caro Jovem Adulto)
“
Eu sou um corrimão na beira da corrente: quem puder se agarrar a mim, que se agarre! Mas não sou vossa muleta.
”
”
Friedrich Nietzsche (Assim Falou Zaratustra)
“
Oh, sim! O Tempo está de volta; O Tempo reina como um rei agora; e junto dele aquele velho homem com seu arsenal demoníaco de Memórias, Arrependimentos, Espasmos, Medos, Ansiedades, Pesadelos, Raivas, e Neuroses.
Eu lhe asseguro que os segundos são mais fortes agora, solenemente acentuados, e cada um, saltando do relógio, diz assim, Eu sou a Vida, intolerável, implacável!
”
”
Charles Baudelaire (Paris Spleen)
“
Orfeu rebelde, canto como sou:
Canto como um possesso
Que na casca do tempo, a canivete,
Gravasse a fúria de cada momento;
Canto, a ver se o meu canto compromete
A eternidade do meu sofrimento.
Outros, felizes, sejam os rouxinóis...
Eu ergo a voz assim, num desafio:
Que o céu e a terra, pedras conjugadas
Do moinho cruel que me tritura,
Saibam que há gritos como há nortadas,
Violências famintas de ternura.
Bicho instintivo que adivinha a morte
No corpo dum poeta que a recusa,
Canto como quem usa
Os versos em legítima defesa.
Canto, sem perguntar à Musa
Se o canto é de terror ou de beleza.
”
”
Miguel Torga (Orfeu Rebelde)
“
Quando sou realmente mau, tão perverso que não lhe resta senão erguer as mãos para o céu e perguntar a Deus o que fez para merecer um filho assim, nessas ocasiões o meu pai é convocado para fazer justiça; descobre-se então que a minha mãe é demasiado sensível, um ser demasiadamente delicado, para administrar castigos corporais. «Dói-me mais a mim», ouço-a a explicar à tia Clara, «do que lhe dói a ele. Eu sou assim feita. Não sou capaz, pronto.»
Oh, pobre mãe.
”
”
Philip Roth (Portnoy’s Complaint)
“
Meu Deus, não sou muito forte, não tenho muito além de uma certa fé - não sei se em mim, se numa coisa que chamaria de justiça-cósmica ou a-coerência-final-de-todas-as-coisas. Preciso agora da tua mão sobre a minha cabeça. Que eu não perca a capacidade de amar, de ver, de sentir. Que eu continue alerta. Que,
se necessário, eu possa ter novamente o impulso do vôo no momento exacto. Que eu não me perca, que eu não me fira, que não me firam, que eu não fira ninguém. Livra-me dos poços e dos becos de mim, Senhor. Que meus olhos saibam continuar se alargando sempre. Sinto uma dor enorme de não ser dois e não poder assim um ter partido, outro ter ficado com todas aquelas pessoas.
Volta a pergunta maldita: terei realmente escolhido certo? E o que é o "certo"? Digo que todo caminho é caminho, porque nenhum caminho é caminho. Que aqui ou lá - London, London, Estocolmo, Índia - eu continuaria sempre perguntando. Minhas mãos transpiram, transpiram. O nariz seco por dentro. Não quero escrever mais nada hoje.
”
”
Caio Fernando Abreu (Ovelhas Negras)
“
Não tenho como evitar. Sou... Sou um capítulo curto, com final em aberto. Uma cascateira inveterada. Minto em nome do amor, sem ser poeta. Gostaria que alguém contasse essa minha história, sem que eu tivesse nada com isso. Um narrador, sabe? Num texto em terceira pessoa. A bem da verdade, odeio livros em primeira pessoa. Coisa de gente que faz diários. Não suporto. Posso contar distanciadamente? Ué, posso. Mas e agora? Agora já não é tarde demais? Faz mais de um ano que comecei a escrever isso para você. Não contei nada porque não conto nada a ninguém. Fico assim, mudando de capítulo e disfarçando
”
”
Fernanda Young (Tudo que Você Não Soube)
“
Olha, dona”, interrompeu Salu antes que a mulher continuasse sua pregação, “eu não tenho muita letra nem estudo, mas quero que a senhora entenda uma coisa. Eu não sou a única a morar nesta terra. Muitos desses moradores que vocês querem mandar embora chegaram muito antes de vocês. Vocês não eram nem nascidos. Muitos nasceram aqui. Tenho filhos e netos, todos nasceram em Água Negra. Também não posso dizer o que cada um pensa dela, tim-tim por tim-tim, porque não estou nos pensamentos de ninguém. Mas falo por mim: eu nasci em Bom Jesus, mas também nasci de alguma forma nesta terra. Cheguei aqui moça e jovem. Aqui vivi, criei meus filhos, labutei com meu marido, vi meus vizinhos e compadres serem enterrados, lá no cemitério que vocês fecharam. Fui parida, mas também pari esta terra. Sabe o que é parir? A senhora teve filhos. Mas sabe o que é parir? Alimentar e tirar uma vida de dentro de você? Uma vida que irá continuar mesmo quando você já não estiver mais nesta terra de Deus? Não sei se a senhora sabe, mas eu peguei em minhas mãos a maioria desses meninos, homens e mulheres que a senhora vê por aí. Sou mãe de pegação
deles. Assim como apanhei cada um com minhas mãos, eu pari esta terra. Deixa ver se a senhora entendeu: esta terra mora em mim”, bateu com força em seu peito, “brotou em mim e enraizou.” “Aqui”, bateu novamente no peito, “é a morada da terra. Mora aqui em meu peito porque dela se fez minha vida, com meu povo todinho. No meu peito mora Água Negra, não no documento da fazenda da senhora e de seu marido. Vocês podem até me arrancar dela como uma erva ruim, mas nunca irão arrancar a terra de mim.
”
”
Itamar Vieira Junior (Torto Arado)
“
MANFREDO
Porque não pude contrafazer a minha natureza... porque para mandar é
preciso obedecer... lisonjear... pedir... espreitar as ocasiões... intrometer-se em toda parte... ser uma mentira viva... é assim que deve proceder quem quer ser poderoso entre os seres abjetos de que se compõe a generalidade dos homens: eu, eu não me dignei de fazer parte de um rebanho de lobos... embora como chefe. O leão é só, e eu sou como o leão.
”
”
Lord Byron
“
Vez por outra, embora eu tentasse resistir, prevalecia o aborrecimento em relação a tudo, uma tendência aos julgamentos mordazes, a urgência de brigar. Não quero ser assim, dizia a mim mesma, em especial quando estava caindo no sono, no entanto aquela era eu, e perceber que eu só conseguia me manifestar daquela maneira - amarga, caluniadora - me levava algumas vezes não a me corrigir, mas, como um prazer pérfido, a ser ainda pior. Eu pensava: se não sou amável, tudo bem, que não me amem; ninguém sabe o que carrego dentro do meu peito noite e dia.
”
”
Elena Ferrante (The Lying Life of Adults)
“
E nós que temos os instrumentos nos recusamos a fazer qualquer coisa, porque quem toma atitudes é criticado. Ah, que ótima ideia, mas que atitude já tomei na vida? Em minha defesa, estou muito cansada e não tenho ideias boas. Na verdade, meu problema é que fico irritada com todo mundo por não ter todas as respostas, quando eu também não tenho nenhuma. E quem sou eu para pedir humildade e franqueza dos outros? O que eu já dei ao planeta para pedir tanto em troca? Eu poderia me desintegrar em um monte de poeira que o mundo não daria a mínima, e é assim que tem que ser.
”
”
Sally Rooney (Beautiful World, Where Are You)
“
e eu pensei Lisboa, quando começo a viver? O adiamento intérmino do futuro. Mas de súbito - Oriana. Espera. Como vieste? Não há intervalo para ti no que digo. Como foi? Estás lá, no limite da vida, no limite de todos os limites. Imóvel no espaço, é assim. Talvez no círculo de claridade ao fim do mar. E a tua luz abrindo em claridade, na claridade do mar, olho. E entre a morte do filho ali atrás e a tua no impossível. Aqui estou. E no meio eu, sem saber como sou. Ah, não. Logo que amanheça. Logo que se cumpra o ritual da morte. Tomarei banho, lustral e novo. Ou no terraço da moradia nas Azenhas, respirar fundo o aroma do sem fim.
”
”
Vergílio Ferreira (Até ao Fim)
“
Nenhuma regra moral genérica pode indicar o que devemos fazer; não existem sinais outorgados no mundo. Os católicos replicarão: "Mas claro que há sinais". Admitamos, sou eu mesmo, em todo caso, que escolho o significado que eles têm. Quando eu estava preso, conheci um homem impressionante, que era jesuíta. Ele tinha entrado na ordem da seguinte forma: havia passado por uma série de infortúnios bastante dolorosos; ainda criança, seu pai foi morto, deixando-o pobre. Ele foi recebido como bolsista em uma instituição religiosa onde constantemente lhe repetiam que ele tinha sido aceito por caridade; consequentemente, ele não recebeu muitas das distinções honoríficas com que as crianças são gratificadas; depois, por volta dos dezoito anos, - coisa pueril, mas que foi a gota d'água que fez o vaso transbordar - ele foi reprovado em sua preparação militar. Portanto, esse rapaz podia achar que tudo tinha dado errado para ele; era um sinal, mas um sinal de quê? Ele podia refugiar-se na amargura ou no desespero, mas avaliou, muito habilmente para seu próprio bem, que esse era o sinal de que ele não fora feito para os triunfos seculares, e que só os êxitos da religião, da santidade e da fé é que estavam ao seu alcance. Assim, viu nisso uma mensagem divina e ingressou nas ordens. Quem não vê que a decisão do sentido do sinal foi tomada exclusivamente por ele?
”
”
Jean-Paul Sartre
“
... Eu me desnudo emocionalmente quando confesso minha carência – que estarei perdido sem você, que não sou necessariamente a pessoa independente que tentei aparentar. Na verdade, não passo de um fraco, cuja noção dos rumos ou do significado da vida é muito restrita. Quando choro e lhe conto coisas que, confio, serão mantidas em segredo, coisas que me levarão à destruição, caso terceiros tomem conhecimento delas, quando vou a festas e não me entrego ao jogo da sedução porque reconheço que só você me interessa, estou me privando de uma ilusão há muito acalentada de invulnerabilidade. Me torno indefeso e confiante como a pessoa no truque circense, presa a uma prancha sobre a qual um atirador de facas exercita sua perícia e as lâminas que eu mesmo forneci passam a poucos centímetros da minha pele. Eu permito que você assista a minha humilhação, insegurança e tropeços. Exponho minha falta de amor-próprio, me tornando, dessa forma, incapaz de convencer você (seria realmente necessário?) a mudar de atitude. Sou fraco quando exibo meu rosto apavorado na madrugada, ansioso ante a existência, esquecido das filosofias otimistas e entusiasmadas que recitei durante o jantar. Aprendi a aceitar o enorme risco de que, embora eu não seja uma pessoa atraente e confiante, embora você tenha a seu dispor um catálogo vasto de meus medos e fobias, você pode, mesmo assim, me amar...
”
”
Alain de Botton (The Romantic Movement: Sex, Shopping, and the Novel)
“
Tradução livre por Rodrigo Suzuki Cintra
Quando meu amor jura que é feita de verdade,
Eu acredito nela, apesar de saber que é mentira,
Ela deve pensar que sou qualquer moço sem idade
Que não conhece de fato como o mundo gira.
Assim, inutilmente acreditando que ela me acha jovem,
Apesar de saber que meus melhores dias já não voltam mais,
Simplesmente eu acredito em suas palavras que me comovem,
Na medida em que a verdade não nos satisfaz.
Mas por que ela não admite ser desonesta?
E por que não admito ser um homem idoso?
O melhor do amor é ser hábito que ninguém protesta,
Pois mentir no amor é sempre mais gostoso:
Nos deitamos em nossas mentiras, eu com ela e ela comigo
E na mentira do amor nós encontramos abrigo.
”
”
William Shakespeare
“
Quem me dera poder fazê-lo entender que um coração cheio de amor é um tesouro, é tesouro que baste e que sem ele o intelecto é uma pobreza. (…) Porque o amo, então? Acho que é unicamente porque ele é masculino. No fundo ele é bom, e eu amo-o por isso, mas poderia amá-lo mesmo que ele não fosse. Caso ele me batesse ou abusasse de mim, mesmo assim ainda continuaria a amá-lo. (…) Ele é forte e bonito e amo-o por isso e admiro-o e tenho orgulho nele. Mas também poderia amá-lo se não tivesse essas qualidades. Se ele fosse dor, eu amá-lo-ia. Se ele fosse um destroço, eu amá-lo-ia. E trabalharia para ele e seria sua escrava e rezaria por ele e velaria à sua cabeceira até à hora da minha morte. Sim, creio que o amo simplesmente porque ele é meu e é masculino. (…) A vida sem ele, não seria vida, ora como poderia aguentá-la? Esta prece também é imortal e não deixará de ser dita e pensada enquanto a minha espécie subsistir. Eu sou a primeira esposa e na última esposa estará a minha réplica.
”
”
Mark Twain (The Diaries of Adam and Eve)
“
Estou escrevendo há muito tempo e estou cansada, é cada vez mais difícil manter esticado o fio do relato dentro do caos dos anos, dos acontecimentos miúdos e grandes, dos humores. Sendo assim, ou tendo a passar por cima dos fatos relacionados a mim para logo agarrar Lila pelos cabelos com todas as complicações que ela tem, ou, pior, deixo-me tomar pelos acontecimentos de minha vida apenas porque os desembucho com mais facilidade. Mas tenho de me furtar a essa encruzilhada. Não devo seguir o primeiro caminho, no qual - já que a própria natureza de nossa relação impõe que eu só possa chegar a ela passando por mim - eu acabaria, caso me colocasse de fora, encontrando cada vez menos vestígios de Lila. Nem devo, por outro lado, seguir o segundo. De fato, o que ela com certeza mais apoiaria é que eu falasse de minha experiência cada vez mais profusamente. Vamos - me diria -, nos conte que rumo sua vida tomou, quem se importa com a minha, confesse que ela não interessa nem mesmo a você. E concluiria: eu sou um rascunho em cima de um rascunho, totalmente inadequada para um de seus livros; me deixe em paz, Lenù, não se narra um apagamento
”
”
Elena Ferrante
“
Pela noite fechada de silêncio, escrevo. É uma noite de Inverno, limpa, definitiva, uma evidência brilha na sua linearidade, no diagrama das estrelas… Olho-a, ouço-a. Todas as vozes obscuras, como bichos nocturnos, sobem ao limite do meu espanto, da minha vigília. (…)
Um homem novo recria-se-me na transparência do seu ser. Sinto-o leve e lúcido, instantâneo e incandescente, por entre cinzas que o fogo deixou. (…) o homem primordial que em mim sobe tem a face atónita de uma primeira interrogação. E não é isso uma imagem, uma figuração com que procuremos, contra um hábito endurecido, abrir os olhos a um novo modo de ver. (…) Sou eu só, diante de mim e da noite, irredutível e inútil na minha lucidez.
E no entanto, nenhuma desculpa me tranquiliza o remorso da urgência de um mundo a repovoar. É um remorso que se agrava à certeza de que os outros se reconhecem na mesma urgência e vazio. (…)
A invenção de um novo mundo não é uma invenção de ninguém. Não está na nossa mão criá-lo; está só, quando muito, ajudar no seu parto. E todavia – sabemo-lo bem – é em nós que ele se gera; mas tão longe de onde estamos, que só já quando irrevogável o sabemos. Um mundo acontece na escolha interminável de nós. Assim pois, testemunhas apenas à superfície desse acto de criação, (…), nós cumprimos sempre as ordens que ninguém deu e não as pudemos pois discutir. (…) A última justificação de todas as justificações escapa sempre ao homem e dela chega apenas até ele o seu eco pluralizado. (…)
E todo o problema do mundo de hoje está aí. Regresso a mim, ao meu corpo distinto e classificável onde todo o milagre aconteceu. E pergunto-me, suspenso, como foi possível, como é que uma breve semente abriu assim até essa Voz, até ao silêncio donde essa Voz falou. Frente ao grande sono dos homens que o esqueceram, na atenção inexorável ao sem limite de mim, a minha vigília arde como um fogo assassino. É um fogo alto e poderoso. Lume breve na minha intimidade, na brevidade de um pequeno ser, eu, anónimo e avulso, ocasional e frágil – eu. E todavia, esse lume vibra de vigor, brilha único e intenso contra o assalto da noite. Trago em mim a força monstruosa de interrogar, mais força que a força de uma pergunta. (…) o que eu trago em mim é o anúncio do fim do mundo, ou mais longe, e decerto, o da sua recriação.
”
”
Vergílio Ferreira (Invocação ao meu corpo)
“
Talvez o senhor escreva para a posteridade. Mas queira ou não queira, para alguém escreve.
Mas é uma cilada: se consinto, o Autodidacta triunfa e sou imediatamente contornado, reivindicado, ultrapassado, porque o humanismo toma à sua conta e funda na mesma massa todas as atitudes humanas. Que agradável que é às vezes poder conversar assim, ao abandono.
Deitei um olhar à minha volta: móveis leves e soltos, e eu próprio. Era o que existia. O passado não existia. Nem as coisas, nem sequer no meu pensamento. Havia muito tempo que eu tinha compreendido que o meu me tinha escapado. Mas julgava, até então, que se tinha retirado do meu alcance. Para mim o passado era apenas entrada na reforma: era outra maneira de existir, um estado de férias e de inacção, cada acontecimento quando findara o seu papel se arrumava atinadamente, por si próprio, numa caixa e se tornava acontecimento honorário: tal é a dificuldade que se tem em imaginar o nada. Agora compreendia: a coisas são inteiramente o que parecem, e por trás delas...não há nada.Quando uma pessoa quer compreender uma coisa coloca-se diante dela, sem auxílio. De nada serviria todo o passado do mundo.
Acho que não temos de ir buscar tão longe o sentido da vida
”
”
Jean-Paul Sartre
“
Amava Aida desde sempre, o nosso encontro aconteceu na eternidade. Só assim eu entendo que não saiba contar bem como tudo começou. Porque os factos não são indício de nada e o verdadeiro indício está antes e depois de todos os indícios. Há a minha infância, há a morte da minha mãe, mas no que se passa em mim estou só eu. E é dessa solidão absoluta que o absurdo nasceu. Rapidamente ultrapassei os limites da plenitude de um encontro que se basta, de duas mãos que se prendem, de dois olhares que se fitam. Rapidamente me interroguei sobre quem estava atrás desse olhar e dessas mãos e quis chegar até lá... É tão difícil explicar. É tão difícil e tão alto e tão fora da nossa medida, que estremeço de loucura e as minhas palavras se atropelam. Mas isto existe, como é possível que seja um erro? Há um além para lá de ti, da pessoa que vejo e está aqui e que é a pessoa que és. Trago em mim o apelo absoluto da identidade absoluta, a exigência da comunhão verdadeira. Porque eu sou de mais para mim - e tu. Jamais te saberei? Jamais tocarei com as minhas mãos a chama que arde em ti? Estamos cheios de prodígio, não é estúpido que o ignoremos? Para lá de todas as portas há uma porta ainda, e essa é que é a porta da nossa morada...
”
”
Vergílio Ferreira (Estrela Polar)
“
Conheci que Madalena era boa em demasia, mas não conheci tudo de uma vez. Ela se revelou pouco a pouco, e nunca se revelou inteiramente. A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste, que me deu uma alma agreste.
E, falando assim, compreendo que perco o tempo. Com efeito, se me escapa o retrato moral de minha mulher, para que serve esta narrativa? Para nada, mas sou forçado a escrever.
Quando os grilos cantam, sento-me aqui à mesa da sala de jantar, bebo café, acendo o cachimbo. Às vezes as idéias não vêm, ou vêm muito numerosas e a folha permanece meio escrita, como estava na véspera. Releio algumas linhas, que me desagradam. Não vale a pena tentar corrigi-las. Afasto o papel.
Emoções indefiníveis me agitam inquietação terrível, desejo doido de voltar, tagarelar novamente com Madalena, como fazíamos todos os dias, a esta hora. Saudade? Não, não é isto: é desespero, raiva, um peso enorme no coração.
Procuro recordar o que dizíamos. Impossível. As minhas palavras eram apenas palavras, reprodução imperfeita de fatos exteriores, e as dela tinham alguma coisa que não consigo exprimir. Para senti-las melhor, eu apagava as luzes, deixava que a sombra nos envolvesse até ficarmos dois vultos indistintos na escuridão.
”
”
Graciliano Ramos (São Bernardo)
“
O que há é que estou resolvido a sumir. Eu sei que sou um desfavorecido da
natureza. Estive doente durante 24 anos, desde o meu nascimento até
completar 24 anos. Deve tomar tudo quanto eu digo agora como coisa de
um homem doente. Vou-me embora, imediatamente, imediatamente. Pode
ficar certa disso. Não me sinto envergonhado, não, pois seria estranho que
eu estivesse envergonhado disso, não seria? Mas estou deslocado na
sociedade… Falo, não por vaidade ferida!… Estive refletindo durante estes
três dias e achei cá comigo que lhe devia explicar certas coisas
sinceramente e de modo bem digno para com a senhora, na primeira
oportunidade que eu tivesse. Há ideias, grandes ideias, sobre as quais eu
não devo começar a falar, porque na certa faria todo o mundo rir. O Príncipe
Chtch… ainda agora me avisou sobre tal coisa. Minha atitude não é
conveniente. Não tenho nenhum senso de proporção. Minhas palavras são
incoerentes, não se enquadrando no assunto; e isso é uma degradação para
tais ideias. Portanto, não tenho nenhum direito!… Além disso, sou sensível
morbidamente… Estou mais do que certo de que ninguém, aqui nesta casa,
feriria meus sentimentos e que sou mais querido aqui do que mereço. Mas
eu sei (e sei ao certo) que vinte anos de doença devem deixar traços, e que
por conseguinte é impossível a qualquer pessoa deixar de rir de mim… às
vezes… Não é assim, não é mesmo?
”
”
Fyodor Dostoevsky (The Idiot)
“
D’ENGENHO DE DENTRO (excertos)
12/10
eu queria escrever sobre ana, mas ainda é cedo, eu não sei, não sei se posso e, finalmente, vejo que não quero. sobre a vinda de mamãe e papai até aqui, também não: falta qualquer novidade a esse respeito – a não ser que valha a pena anotar que reencontrar papai depois de três anos é como reencontrar um velho amigo que não via há três dias; e reencontrar mamãe depois de dois anos é como ser apresentado a alguém cujo nome, fama e aventuras eu já conhecia de sobra e que, portanto, me pareceu estranha, distante, mítica. mais ou menos assim. mas prefiro escrever sobre este lugar e minha vida dentro dele. a melhor sensação é a de reconquistar inteiramente o anonimato no contato diário com meus pares de hospício. posso gritar: “meu nome é torquato neto, etc., etc.”; do outro lado uma voz sem dentes dirá: meu nome é vitalino; e outra: o meu é atagahy! aqui dentro só eu mesmo posso ter algum interesse: minhas aventuras, nem um pingo. meu nome podia ser, josé da silva – e de preferência, mas somente no que se refere a mim. a eles não interessa. O dr. Osvaldo não pode fugir. nem fingir: mas isso eu comecei a ver, de fato, logo mais quando teremos nossa primeira entrevista. o anonimato me assegura uma segurança incrível: já não preciso mais (pelo menos enquanto estiver aqui) liquidar meu nome e formar nova reputação como vinha fazendo sistematicamente como parte do processo autodestrutivo em que embarquei – e do qual, certamente, jamais me safarei por completo. mas sobre isso, prefiro dar mais tempo ao tempo: eu sou obrigado a acreditar no meu destino. (isso é outra conversa que só rogério entenderia). tem um livro chamado: o hospício é deus. eu queria ler esse livro. foi escrito, penso, neste mesmo sanatório. vou pedir a alguém para me conseguir esse livro.
13/10
eu: pronome pessoal e intransferível. viver: verbo transitório e transitivo, transável, conforme for. a prisão é um refúgio: é perigoso acostumar-se a ela. e o dr. Osvaldo? Não exclui a responsabilidade de optar, ou seja:?
20/10
É preciso não beber mais. Não é preciso sentir vontade de beber e não beber: é preciso não sentir vontade de beber.
É preciso não dar de comer aos urubus. É preciso fechar para balanço e reabrir. É preciso não dar de comer aos urubus. Nem esperanças aos urubus. É preciso sacudir a poeira.
É preciso poder beber sem se oferecer em holocausto. É preciso.
É preciso não morrer por enquanto. É preciso sobreviver para verificar. Não pensar mais na solidão de Rogério, e deixá-lo. É preciso não dar de comer aos urubus. É preciso enquanto é tempo não morrer na via pública.
4/4/71
Debaixo da tempestade
sou feiticeiro de nascença
atrás desta reticência
tenho o meu corpo cruzado
a morte não é vingança
7/4/71
– Foi um caminhão que passou. bateu na minha cabeça. aqui. isso aqui é péssimo, não me lembro de nada.
– Eles não deixam ninguém ficar em paz aqui dentro. são bestas. Não deixam a gente cortar a carne com faca mas dão gilete pra se fazer a barba.
– Pode me dar um cigarro? eu só tenho um maço, eu tenho que pedir porque senão acaba. Pode me dar as vinte.
”
”
Torquato Neto (26 Poetas Hoje)
“
Olha, dona”, interrompeu Salu antes que a mulher continuasse sua pregação, “eu não tenho muita letra nem estudo, mas quero que a senhora entenda uma coisa. Eu não sou a única a morar nesta terra. Muitos desses moradores que vocês querem mandar embora chegaram muito antes de vocês. Vocês não eram nem nascidos. Muitos nasceram aqui. Tenho filhos e netos, todos nasceram em Água Negra. Também não posso dizer o que cada um pensa dela, tim-tim por tim-tim, porque não estou nos pensamentos de ninguém. Mas falo por mim: eu nasci em Bom Jesus, mas também nasci de alguma forma nesta terra. Cheguei aqui moça e jovem. Aqui vivi, criei meus filhos, labutei com meu marido, vi meus vizinhos e compadres serem enterrados, lá no cemitério que vocês fecharam. Fui parida, mas também pari esta terra. Sabe o que é parir? A senhora teve filhos. Mas sabe o que é parir? Alimentar e tirar uma vida de dentro de você? Uma vida que irá continuar mesmo quando você já não estiver mais nesta terra de Deus? Não sei se a senhora sabe, mas eu peguei em minhas mãos a maioria desses meninos, homens e mulheres que a senhora vê por aí. Sou mãe de pegaçã deles. Assim como apanhei cada um com minhas mãos, eu pari esta terra. Deixa ver se a senhora entendeu: esta terra mora em mim”, bateu com força em seu peito, “brotou em mim e enraizou.” “Aqui”, bateu novamente no peito, “é a morada da terra. Mora aqui em meu peito porque dela se fez minha vida, com meu povo todinho. No meu peito mora Água Negra, não no documento da fazenda da senhora e de seu marido. Vocês podem até me arrancar dela como uma erva ruim, mas nunca irão arrancar a terra de mim.
”
”
Itamar Vieira Junior (Torto Arado)
“
Então prostrei-me aos seus pés, pensando: "Esta é certamente a hora da minha morte, pois o Leão (que é digno de toda a honra) bem saberá que, durante toda a minha vida, tenho servido a Tash e não a ele. No entanto, melhor é ver o Leão e depois morrer do que ser Tisroc do mundo inteiro e viver sem nunca havê-lo encontrado." Porém, o glorioso ser inclinou a cabeça dourada e me tocou a testa com a língua, dizendo: "Filho, sê bem-vindo!" Mas eu repliquei: "Ai de mim, Senhor! Não sou filho teu, mas, sim, um servo de Tash!" "Criança", continuou ele, "todo o serviço que tens prestado a Tash, eu o considero como serviço prestado a mim." Então, tão grande era o meu anseio por sabedoria e conhecimento, que venci o temor e resolvi indagar o glorioso ser: "Senhor, é verdade, então, como disse o macaco, que tu e Tash sois um só? O Leão deu um rugido tão forte que a terra tremeu (sua ira, porém, não era contra mim), dizendo: "É mentira! Não porque ele e eu sejamos um, mas por sermos o oposto um do outro é que tomo para mim os serviços que tens prestado a ele. Pois eu e ele somos tão diferentes, que nenhum serviço que seja vil pode ser prestado a mim, e nada que não seja vil pode ser feito para ele. Portanto, se qualquer homem jurar em nome de Tash e guardar o juramento por amor a sua palavra, na verdade jurou em meu nome, mesmo sem saber, e eu é que o recompensarei. E se algum homem cometer alguma crueldade em meu nome, então, embora tenha pronunciado o nome de Aslam, é a Tash que está servindo, e é Tash quem aceita suas obras. Compreendes isto, filho meu?" Eu respondi: "Senhor, tu sabes o quanto eu compreendo." E, constrangido pela verdade, acrescentei: Mesmo assim, tenho aspirado por Tash todos os dias da minha vida." "Amado", falou o glorioso ser, não fora o teu anseio por mim, não terias aspirado tão intensamente, nem por tanto tempo. Pois todos encontram o que realmente procuram.
”
”
C.S. Lewis (The Last Battle (Chronicles of Narnia, #7))
“
«Sabe, meu amor, que te amo. E que te amarei até morrer. É por isso que todo o resto me parece tão pouco, um nada imenso de nenhum valor. Sabe que te choro e te venero, e sobretudo que te espero. E sabe que te vejo, com olhos de quem vê, e que te conheço, como só conhece um livro quem o lê. Sabe que à amargura dos dias subtraí a doçura de te ter. Sim, o cintilar da vida, ao meu redor, por te ter. Por saber-te nunca muito longe, embora raramente aqui. por saber que, nos teus olhos - laivos de mel e coisas mais profundas, lucidez e racionalidade - leio que também me lês. Deslizemos agora para o silêncio, perfeição. Não vejo já necessidade de prender a tua mão, pois que sinto que te prendi. Ao teu olhar, que se enreda no meu. que estranhas asas povoam as minhas entranhas, murmuram a meus ouvidos. que grande és, que tola sou. Sabe, meu amor, que tenho plena consciência das nossas dimensões. Basta-me ter-te assim, como te tenho, para seguir pela vida a sorrir. Em mim não se apagarão mais luzes, em mim, à noite, acendem-se as estrelas. Fosse eu firmamento, e tu o cimento com que se constrói o mundo. Sem nós, nada. Reservatório de tudo. Conheço-te, milagre maior, e tenho-te, não podia ter-te melhor. Porque caminhas a meu lado, não acorrentado a mim. Porque me beijas a testa e porque te louvo as mãos. Homem honesto. Amor maior. Porque me guias na escuridão das ingenuidades - resquícios da infância - e porque não me apontas caminhos, descreves-me paisagens. Sim e não, talvez e também. Veremos o que dali vem. E eu, a teu lado, que tola sou, pequena e feliz, que feliz é quem amou assim um grande amor. Ecos de palavras, distantes. Que importa se não somos amantes? Se nunca o seremos? Sei que te amo e, nalguma linguagem, sei que me amas também. Se é na matemática dos racionais, se na pureza dos amigos, se no secretismo dos poetas, isso não sei. Sei que te carrego em mim e que, se fechar os olhos, me sorris. Estás comigo a todo o instante. Não te guardo em caixas, fotografias ou objectos. Caberias lá tu em caixas, mundo, permanecerias lá tu imóvel, como os objectos, vida. Quanto muito, vejo-te às vezes num livro cá por casa. Mas sei-te, e sei-te quase de cor. Não quero saber-te, na totalidade ou de cor. Não o poderia, é inalcançável. Tão grande és tu, que não acabas. Em mim nunca acabarás. A felicidade que a tua volta me trouxe. E sabe que vou chorar, «a cada ausência tua eu vou chorar». Mas não lágrimas; é paixão, fogo, urgência. Coisa física, átomos de energia em colisão. Ainda assim, ter-te-ei aqui, para seguir pela vida a sorrir. A cada vez que afastar os lençóis, pedir-te-ei que te chegues para lá. E ainda que a tua boca nunca sobre a minha pouse, e ainda que nunca venhas a sorrir enquanto te beijo, sabe, meu amor, que te amo, e que te amarei até morrer. Com a certeza de quem quer viver, de quem quer seguir, a vida inteira, com a alma enredada na tua. Que o teu chá seja fervido da minha chaleira, e que os teus livros disputem com os meus o espaço da prateleira. Meu amor, sabe que te amarei a vida inteira.»
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Célia Correia Loureiro (Os Pássaros)
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Conheci que Madalena era boa em demasia, mas não conheci tudo de uma vez. Ela se revelou pouco a pouco, e nunca se revelou inteiramente. A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste, que me deu uma alma agreste. E, falando assim, compreendo que perco o tempo. Com efeito, se me escapa o retrato moral de minha mulher, para que serve esta narrativa? Para nada, mas sou forçado a escrever.
Quando os grilos cantam, sento-me aqui à mesa da sala de jantar, bebo café, acendo o cachimbo. Às vezes as idéias não vêm, ou vêm muito numerosas e a folha permanece meio escrita, como estava na véspera. Releio algumas linhas, que me desagradam. Não vale a pena tentar corrigi-las. Afasto o papel.
Emoções indefiníveis me agitam inquietação terrível, desejo doido de voltar, tagarelar novamente com Madalena, como fazíamos todos os dias, a esta hora. Saudade? Não, não é isto: é desespero, raiva, um peso enorme no coração.
Procuro recordar o que dizíamos. Impossível. As minhas palavras eram apenas palavras, reprodução imperfeita de fatos exteriores, e as dela tinham alguma coisa que não consigo exprimir. Para senti-las melhor, eu apagava as luzes, deixava que a sombra nos envolvesse até ficarmos dois vultos indistintos na escuridão.
Lá fora os sapos arengavam, o vento gemia, as árvores do pomar tornavam-se massas negras.
- Casimiro!
(...) A figura de Casimiro Lopes aparece à janela, os sapos gritam, o vento sacode as árvores, apenas visíveis na treva. Maria das Dores entra e vai abrir o comutador.
Detenho-a: não quero luz.
O tique-taque do relógio diminui, os grilos começam a cantar. E Madalena surge no lado de lá da mesa. Digo baixinho:
- Madalena!
A voz dela me chega aos ouvidos. Não, não é aos ouvidos. Também já não a vejo com os olhos. Estou encostado à mesa, as mãos cruzadas. Os objetos fundiram-se, e não enxergo sequer a toalha branca.
- Madalena...
A voz de Madalena continua a acariciar-me. Que diz ela? Pede-me naturalmente que mande algum dinheiro a Mestre Caetano. Isto me irrita, mas a irritação é diferente das outras, é uma irritação antiga, que me deixa inteiramente calmo. Loucura estar uma pessoa ao mesmo tempo zangada e tranqüila. Mas estou assim. Irritado contra quem? Contra Mestre Caetano. Não obstante ele ter morrido, acho bom que vá trabalhar. Mandrião!
A toalha reaparece, mas não sei se é esta toalha sobre que tenho as mãos cruzadas ou a que estava aqui há cinco anos.
(...) Agitam-se em mim sentimentos inconciliáveis, colerizo-me e enterneço-me; bato na mesa e tenho vontade de chorar. Aparentemente estou sossegado: as mãos continuam cruzadas sobre a toalha e os dedos parecem de pedra. Entretanto ameaço Madalena com o punho. Esquisito.
Distingo no ramerrão da fazenda as mais insignificantes minudências. Maria das Dores, na cozinha, dá lições ao papagaio. Tubarão rosna acolá no jardim. O gado muge no estábulo. O salão fica longe: para irmos lá temos de atravessar um corredor comprido. Apesar disso a palestra de Seu Ribeiro e Dona Glória é bastante clara. A dificuldade seria reproduzir o que eles dizem. É preciso admitir que estão conversando sem palavras.
Padilha assobia no alpendre. Onde andará Padilha? Se eu convencesse Madalena de que ela não tem razão... Se lhe explicasse que é necessário vivermos em paz... Não me entende. Não nos entendemos. O que vai acontecer será muito diferente do que esperamos. Absurdo.
Há um grande silêncio. Estamos em julho. O nordeste não sopra e os sapos dormem.
(...)
Repito que tudo isso continua a azucrinar-me. O que não percebo é o tique-taque do relógio. Que horas são? Não posso ver o mostrador assim às escuras. Quando me sentei aqui, ouviam-se as pancadas do pêndulo, ouviam-se muito bem. Seria conveniente dar corda ao relógio, mas não consigo mexer-me.
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Graciliano Ramos (São Bernardo)
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Enquanto eu crescia, via minhas amigas passarem por vários meninos, um após o outro, e sempre acharem uma razão para descartá-los, se sentindo insatisfeitas, frustradas ou usadas. Eu olhava para elas e pensava que não queria ser assim. E essas meninas, elas estão todas solteiras agora, e parece que vão continuar assim para sempre, porque estão sempre em busca do príncipe encantado. Elas têm uma imagem de quem ele é, como ele é, o que ele faz e como se comporta. E é uma fantasia, uma total fantasia. As mesmas besteiras que falam para as mulheres desde... sempre.
Príncipe encantado. O homem perfeito. O boneco Ken. O espécime perfeito. O Solteirão. O marido ideal. Porque esses caras, os incrivelmente bonitos, os charmosos, os que viram seu mundo de cabeça para baixo, os que parecem bons demais para ser verdade, bem, eles costumam ser bons demais para ser verdade. É uma outra palavra para conquistador, uma descrição mais apropriada.
Sociopata.
É impressionante quantas mulheres se apaixonam por caras assim, caem no mesmo papo, mil e uma vezes, e então amaldiçoam o dia em que o conheceram.
O jogo da sedução... é um dos truques mais velhos que existem. E na realidade é o que é:
Um jogo de sorte.
Sabe aquele jogo em que uma pessoa coloca uma pedra ou uma bolinha embaixo de um de três ou quatro copos e os embaralha sem parar até você adivinhar sob qual copo a pedra está? Observe os copos se moverem e tente adivinhar qual contém o homem certo. Jogue este jogo e você vai perder. Sempre. É certo.
Ninguém quer acreditar que está ligado ao outro, especialmente no amor. Porque isso dói pra cacete. Talvez mais do que qualquer outra coisa no mundo. Te atinge no peito. Te faz sentir enjoada. Te faz sentir burra. Muito, muito burra. Então a melhor coisa que alguém tem a fazer numa situação destas é:
Fingir que não foi pega de surpresa.
Fingir que sempre soube de tudo.
Fingir que nunca aconteceu.
Começar tudo outra vez.
E desta vez, dizer para si mesmas, nunca mais. Nunca vou cair no mesmo truque de novo.
Mas vão.
Vão cair porque não sabem o que querem da vida e, até saberem, estão fadadas a repetir padrões de tempos em tempos, destinadas a repetir os mesmos erros. Porque estão buscando uma fantasia inalcançável. Ou o homem perfeito. O marido perfeito. O amante perfeito.
E a vida não é assim.
Realmente não é.
Não é mesmo.
Pessoas não são assim.
E isso não se aplica somente a mulheres. Homens são vítimas de seu próprio autoengano também. Os mais sensíveis, pelo menos. Os que são evoluídos o suficiente para pensar em mulheres como mais do que apenas um receptáculo para seu gozo. Às vezes, eles são muito evoluídos. Eles pensam muito. Eles colocam as mulheres em um pedestal, idealizam a companheira perfeita num nível que ninguém pode atingir. Pelo menos, eu sei que eu não posso. E para mim, isso apenas parece ser a receita para uma vida de decepção e relacionamentos fracassados. De procurar incessantemente pela pessoa certa e sempre acabar com a errada. Muito errada.
Este é o jogo do amor. Um jogo em que todos perdem.
Você vai dizer, isso é horrível.
Eu digo, realista.
Eu não estou dizendo que não acredito em amor, porque eu acredito. E, se duvidar, sou capaz de admitir que é a única coisa em que eu acredito. Nada de Deus, dinheiro, pessoas. Somente no amor. E eu não estou sugerindo que ninguém abaixe seu nível de exigência, ou se contente com pouco. Longe disso.
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Sasha Grey (The Juliette Society (The Juliette Society, #1))
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Pessimista — eu não o sou. Ditosos os que conseguem traduzir para universal o seu sofrimento. Eu não sei se o mundo é triste ou mau nem isso me importa, porque o que os outros sofrem me é aborrecido e indiferente. Logo que não chorem ou gemam, o que me irrita e incomoda, nem um encolher de ombros tenho — tão fundo me pesa o meu desdém por eles — para o seu sofrimento.
Mas nem quem crê que a vida seja meio luz meio sombras. Eu não sou pessimista. Não me queixo do horror da vida. Queixo-me do horror da minha. O único facto importante para mim é o facto de eu existir e de eu sofrer e de não poder sequer sonhar-me de todo para fora de me sentir sofrendo.
Sonhadores felizes são os pessimistas. Formam o mundo à sua imagem e assim sempre conseguem estar em casa. A mim o que me dói mais é a diferença entre o ruído e a alegria do mundo e a minha tristeza e o meu silêncio aborrecido.
A vida com todas as suas dores e receios e solavancos deve ser boa e alegre, como uma viagem em velha diligência para quem vai acompanhado (e a pode ver).
Nem ao menos posso sentir o meu sofrimento como sinal de Grandeza. Não sei se o é. Mas eu sofro em coisas tão reles, ferem-me coisas tão banais que não ouso insultar com essa hipótese a hipótese de que eu possa ter génio.
A glória de um poente belo, com a sua beleza entristece-me. Ante ele eu digo sempre: como quem é feliz se deve sentir contente ao ver isto!
E este livro é um gemido. Escrito ele já o Só não é o livro mais triste que há em Portugal.
Ao pé da minha dor todas as outras dores me parecem falsas ou íntimas. São dores de gente feliz ou dores de gente que vive e se queixa. As minhas são de quem se encontra encarcerado da vida, à parte...
Entre mim e a vida...
De modo que tudo o que angustia vejo. E tudo o que alegra não sinto. E reparei que o mal mais se vê que se sente, a alegria mais se sente do que se vê. Porque não pensando, não vendo, certo contentamento adquire-se, como o dos místicos e dos boémios e dos canalhas. Mas tudo afinal entra em casa pela janela da observação e pela porta do pensamento.
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Fernando Pessoa (Livro do desassossego)
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Mesmo que eu reclame um pouco', dizia seu coração, 'é porque sou um coração de homem, e os corações de homem são assim. Têm medo de realizar seus maiores sonhos, porque acham que não o merecem, ou não vão consegui-lo. Nós, os corações, morremos de medo só de pensar em amores que partiram para sempre, em momentos que poderiam ter sido bons e que não foram, em tesouros que poderiam ter sido descobertos e ficaram para sempre escondidos na areia. Porque, quando isso acontece, terminamos sofrendo muito.
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Paulo Coelho (The Alchemist)
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O amor
1Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o sino que ressoa ou como o prato que retine.
2Ainda que eu tenha o dom de profecia, saiba todos os mistérios e todo o conhecimento e tenha uma fé capaz de mover montanhas, se não tiver amor, nada serei.
3Ainda que eu dê aos pobres tudo o que possuo e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada disso me valerá.
4O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha.
5Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor.
6O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade.
7Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
8O amor nunca perece; mas as profecias desaparecerão, as línguas cessarão, o conhecimento passará.
9Pois em parte conhecemos e em parte profetizamos;
10quando, porém, vier o que é perfeito, o que é imperfeito desaparecerá.
11Quando eu era menino, falava como menino, pensava como menino e raciocinava como menino. Quando me tornei homem, deixei para trás as coisas de menino.
12Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então, conhecerei plenamente, da mesma forma com que sou plenamente conhecido.
13Assim, permanecem agora estes três: a fé, a esperança e o amor. O maior deles, porém, é o amor...
Love
Even if I speak the tongues of men and angels, if I don't have love, I'll be like a bell that resounds or like a plate that rattles.
2Even if I have the gift of prophecy, know all mysteries and all knowledge, and have a faith that can move mountains, without love I am nothing.
3Even if I give all I have to the poor and give my body to be burned, if I do not have love, none of it avails me.
4Love is patient, love is kind. It does not envy, it does not boast, it is not proud.
5It does not mistreat, it does not seek its own interests, it is not easily angered, it does not hold a grudge.
6Love does not rejoice in unrighteousness, but rejoices in the truth.
7Everything suffers, everything believes, everything hopes, everything supports.
8Love never perishes; but prophecies will disappear, tongues will cease, knowledge will pass away.
9For in part we know and in part we prophesy;
10but when the perfect comes, the imperfect will disappear.
11When I was a child, I spoke like a child, I thought like a child, and I reasoned like a child. When I became a man, I left boyish things behind.
12 Now, therefore, we see only a dim reflection, as in a mirror; but then we will see face to face. Now I know in part; then I shall know fully, just as I am fully known.
13So now these three remain: faith, hope and love. The biggest one, however, is love.
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Corintios 13
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Sabe Igiaba, quando te vi assim, eu me senti impotente. Eu era tua mãe, uma adulta, mas me sentia sem recursos.' Porém, mamãe tinha e ainda tem muitos recursos. Começou a me contar histórias da Somália. Porque, para os nômades somalis, sempre há uma solução escondida numa história. Suas histórias tinham um objetivo: ela queria que eu entendesse que não surgíamos do nada; que por trás da gente havia um país, tradições, toda uma história. Não existiam só os antigos romanos e gauleses, não havia só os latinorum e a ágora grega. Havia também o antigo Egito e os coletores de incenso do Reino de Punt, ou seja, da nossa Somália. Havia os reinos de Ashanti e Bambara. Ela queria que eu me sentisse orgulhosa da minha pele negra e da terra que tínhamos deixado para trás por motivos de força maior. Ela me contava dos nossos reinos distantes, das fortes ligações com o Egito, com a Índia, com Portugal, com a Turquia. Ouvindo a mamãe, eu sentia o eflúvio paradisíaco de incenso e unsi, cheiros que motivaram a rainha Hatshepsut da décima-oitava dinastia egípcia a ordenar uma expedição à Somália. Com as suas histórias, minha mãe me livrou do medo que eu tinha de ser uma caricatura viva criada pela cabeça de alguém. Com as suas histórias, Ela fez de mim uma pessoa. De alguma forma, ela me pariu novamente. [...] foi somente quando eu voltei para Somália que comecei a usar novamente minha língua materna. Em poucos meses, comecei a falar muito bem o somali. Agora, posso dizer que tenho duas línguas-mãe que me amam na mesma medida. Graças à palavra, sou hoje o que sou. [...] Eu sou fruto desse caos entrelaçado. E o meu mapa é o espelho daqueles anos de mudanças. Não é um mapa coerente. É centro, mas também é periferia. É Roma, mas também é Mogadíscio. É Igiaba, mas também é você.
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Igiaba Scego (La mia casa è dove sono)
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E como você acabará, leitor? Se você não é homem, homem como eu, quer dizer, comediante e autor de si mesmo, então não deve ler, por medo de esquecer de si mesmo. [...] Nossa obra é nosso espírito e minha obra sou eu mesmo que estou me fazendo dia após dia e século após século, assim como sua obra é você mesmo, leitor, que
se está fazendo momento após momento, agora me ouvindo como eu estou lhe falando. Porque quero crer que você me ouve mais do que me lê, assim como eu lhe falo mais do que lhe escrevo. Somos nossa própria obra.
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Miguel de Unamuno (Cómo se hace una novela)
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E como você acabará, leitor? Se você não é homem, homem como eu, quer dizer, comediante e autor de si mesmo, então não deve ler, por medo de esquecer de si mesmo. [...] Nossa obra é nosso espírito e minha obra sou eu mesmo que estou me fazendo dia após dia e século após século, assim como sua obra é você mesmo, leitor, que se está fazendo momento após momento, agora me ouvindo como eu estou lhe falando. Porque quero crer que você me ouve mais do que me lê, assim como eu lhe falo mais do que lhe escrevo. Somos nossa própria obra
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Miguel de Unamuno (Cómo se hace una novela)
“
Na vida, para mim, não há deleite.
Ando a chorar convulsa noite e dia ...
E não tenho uma sombra fugidia
Onde poise a cabeça, onde me deite!
E nem flor de lilás tenho que enfeite
A minha atroz, imensa nostalgia! ...
A minha pobre Mãe tão branca e fria
Deu-me a beber a Mágoa no seu leite!
Poeta, eu sou um cardo desprezado,
A urze que se pisa sob os pés.
Sou, como tu, um riso desgraçado!
Mas a minha tortura inda é maior:
Não ser poeta assim como tu és
Para gritar num verso a minha Dor! ..
”
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Florbela Espanca (Livro de Mágoas)
“
eu sou um sistema cibernético individuado, você também, assim como o computador no qual eu escrevo
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Letícia Cesarino (O mundo do avesso: Verdade e política na era digital)
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Matheson instituía assim uma espécie de distopia vampiresca — sua obra servindo, inclusive, como modelo para muitos cenários de “apocalipse zumbi” que surgiriam na segunda metade do século 20, como o clássico A Noite dos Mortos-vivos (1968) de George A. Romero —, fazendo uso desse modo narrativo que se apropria de tensões do presente para imaginar os mais variados cenários de desastre alternativos ou futuros, bem como da figura do vampiro como agente propagador de doenças, o veículo para o apocalipse.
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Thiago Sardenberg (À Noite não Restariam Rosas: A Ameaça Epidêmica em Narrativas Vampirescas)
“
LAMENTO SOBRE O LAGO NEMI
O azar é um dançarino nu entre os alfanjes.
Na praia, além do rosto, a corola das mãos.
Chama teu inimigo. O azar é dançarino.
Reúne os seus herdeiros e proclama o Talião.
A virgem que encontrei coroada de rainúnculos
Não era – assim o quis – a virgem que encontrei.
O azar é um dançarino; teme os seus alfanjes.
Amanhã serei morto, mas agora sou rei.
Nu entre os alfanjes, coroado de rainúnculos,
Chama o teu inimigo e a virgem que encontrei.
Na praia, além do rosto, eu agora estou morto.
O azar é um dançarino. Amanhã serás rei.
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Haroldo de Campos (Poemas)
“
- não sei, não estou chorando por algo específico, não estou triste. nunca choro por algo específico. estou acostumada a chorar, sou a favor do choro.
- eu também - falei, sorrindo.
- não sei por que choro. às vezes penso que estou fingindo, o tempo todo. não sou assim.
- eu gosto de como você é. mesmo que você não saiba como é. e eu também finjo, o tempo todo. contigo e com todo mundo
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Alejandro Zambra (Literatura infantil)
“
A mulher clitoridiana torna-se a figura da consciência feminina: “para desfrutar plenamente do orgasmo clitoridiano, a mulher deve encontrar uma autonomia psíquica”. A reivindicação da diferença sexual significa menos o confinamento em um esquema binário que a desconstrução do conceito de igualdade. As feministas radicais não procuram ser tratadas como iguais aos homens, mas ser consideradas – e antes de tudo se considerar – elas mesmas como o que são “autenticamente”, diferentes. Reconhecer-se como clitoridiana era na época um verdadeiro coming out. Com a “mulher clitoridiana”, a diferença saía do armário.
Para Lonzi, a crítica da construção heteronormativa da sexualidade feminina (ainda não é do ponto de vista temático uma questão de teoria do gênero) também supõe evidentemente uma rejeição da psicanálise freudiana e de sua equação entre clitóris e imaturidade, que transformam as mulheres em “aspirantes vaginais”.
A recusa da psicanálise freudiana é semelhante à rejeição da dialética hegeliana.
O feminismo, para as mulheres, toma o lugar da psicanálise para os homens. Na psicanálise, o homem encontra as razões que o tornam inatacável […]. No feminismo, a mulher encontra a consciência feminina coletiva que elabora os temas de sua liberação. A categoria de repressão na psicanálise equivale à do senhor-escravo no marxismo [e no hegelianismo]: ambos visam a uma utopia patriarcal que vê a mulher como o último ser humano reprimido e subjugado para sustentar o esforço grandioso do mundo masculino que rompe as correntes da repressão e da escravidão.
Questão fundamental da autoconsciência feminista, o clitóris marca doravante a distância irredutível entre submissão e responsabilidade.
Mas como evitar, entre mulheres, a reconstituição da potência fálica? A redução da distância?
Em seu diário, Lonzi evoca dolorosamente as dificuldades que encontra com Ester, sua companheira, que se sente dominada por ela.
Com Ester, só posso me calar. Ela está furiosa consigo mesma e não suporta isso. Agora, ousa dizer o que nunca havia dito, o que era impensável: que, em nossa relação, eu sou o homem e ela é a mulher. É assim que a dicotomia vaginal versus clitoridiana retorna, e nem o feminismo poderá pôr um fim nisso.
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Catherine Malabou (Il piacere rimosso. Clitoride e pensiero)
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O hábito único de sonhar deu-me uma extraordinária nitidez da visão interior. Não só vejo com espantoso e às vezes perturbante relevo as figuras dos meus sonhos, mas com igual relevo vejo minhas ideias abstratas, os meus sentimentos humanos – o que deles me resta –, os meus secretos impulsos, as minhas atitudes psíquicas diante de mim próprio. Afirmo que as minhas próprias ideias abstratas, eu as vejo em mim, eu com uma interior visão real num espaço interno. E assim os meus meandros são-me visíveis nos seus mínimos.
Por isso, conheço-me inteiramente, e, através de conhecer-me inteiramente, conheço inteiramente a humanidade toda. Não há baixo impulso, como não há nobre intuito que não tenha sido relâmpago na minha alma; e eu sei com que gestos cada um se mostra. Sob as máscaras que as más ideias usam, de boas ou indiferentes, mesmo dentro de nós eu pelos gestos as conheço por quem são. Sei o que em nós se esforça por nos iludir. E assim à maioria das pessoas que vejo conheço melhor do que eles a si próprios. Aplico-me muitas vezes a sondá-los, porque assim os torno meus. Conquisto o psiquismo que explico, porque para mim sonhar é possuir. E assim se vê como é natural que eu, sonhador que sou, seja o analítico que me reconheço.
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Fernando Pessoa (Livro do Desassossego I (Livro do Desassossego, #1))
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Eu não conheço o doutor Gabriel Pardal. Há anos atrás ele foi assassinado pela própria esposa. O doutor possuía uma dívida no banco, então essa dívida passou para ela. Ocorre que seu filho a envenenou num suco de maracujá. Como você deve imaginar, a dívida correu para o filho. Acontece que sua irmã jogou seu irmão no precipício e assim a dívida pulou para ela. Estávamos namorando há dois anos com casamento marcado em Verona. Fomos à praia comemorar. Num banho de mar, uma onda mais forte puxou-a num caldo levando-a pro fundo. Não resistiu. Morreu afogada. Juro que sou inocente. Não conheço o doutor Gabriel Pardal, não tenho culpa de nada, mas a dívida do banco agora está em meu nome, não tenho dinheiro, não tenho ninguém, sou a pessoa errada. Por isso esse pulso ardido, na falta de fôlego essa declaração, por isso essa bomba armada.
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Gabriel Pardal (Carnavália)
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E a criança tão humana que é divina É esta minha quotidiana vida de poeta, E é porque ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre, E que o meu mínimo olhar Me enche de sensação, E o mais pequeno som, seja do que for, Parece falar comigo. A Criança Nova que habita onde vivo Dá-me uma mão a mim E a outra a tudo que existe E assim vamos os três pelo caminho que houver, Saltando
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Fernando Pessoa (Fernando Pessoa - Poesia Completa de Alberto Caeiro (Portuguese Edition))
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DATILOGRAFIA Traço, sozinho, no meu cubículo de engenheiro, o plano, Firmo o projeto, aqui isolado, Remoto até de quem eu sou. Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro, O tique-taque estalado das máquinas de escrever. Que náusea da vida! Que abjeção esta regularidade! Que sono este ser assim! Outrora, quando fui outro, eram castelos e cavaleiros (Ilustrações, talvez, de qualquer livro de infância), Outrora, quando fui verdadeiro ao meu sonho, Eram grandes paisagens do Norte, explícitas de neve, Eram grandes palmares do Sul, opulentos de verdes. Outrora. Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro, O tique-taque estalado das máquinas de escrever. Temos todos duas vidas: A verdadeira, que é a que sonhamos na infância, E que continuamos sonhando, adultos, num substrato de névoa; A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros, Que é a prática, a útil, Aquela em que acabam por nos meter num caixão. Na outra não há caixões, nem mortes, Há só ilustrações de infância: Grandes livros coloridos, para ver mas não ler; Grandes páginas de cores para recordar mais tarde. Na outra somos nós, Na outra vivemos; Nesta morremos, que é o que viver quer dizer; Neste momento, pela náusea, vivo na outra... Mas ao lado, acompanhamento banalmente sinistro, Ergue a voz o tique-taque estalado das máquinas de escrever.
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Fernando Pessoa (Fernando Pessoa - Poesia Completa de Álvaro de Campos (Portuguese Edition))
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— Quer dizer que você vai mandar em mim? — disse, testando o companheiro.
— Isso significa que, se eu assim quisesse, poderia fazer você sambar aqui na minha frente que nem a Globeleza. Agorinha mesmo. — Segurou-se para não gargalhar diante a expressão mortificada de Raul. “Definitivamente, não sirvo pra ser lobo alfa”, pensou, e engoliu o riso. — Então, nunca mais erga a voz quando se dirigir a mim, entendeu? E agradeça por ter sido justamente este velho aqui a ter te encontrado primeiro. Poderia ser muito pior.
Raul permaneceu calado, o rabo fantasma enfiado entre as pernas.
— Foi mal — murmurou Raul. — Mas eu não sou bicha — acrescentou, urgente.
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Jana P. Bianchi (Lobo de Rua (A Galeria Creta, #0.5))
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Os israelenses discutem, eu discuto. E ainda assim sou eu quem me levanto toda manhã, faço uma pequena caminhada no deserto, faço uma xícara de café, sento em minha escrivaninha e começo a perguntar-me: ‘Como me sentiria se fosse ela? Como seria estar na pele dele?’ – o que é o que se tem a fazer se se quer escrever até o mais simples dos diálogos: é preciso dividir não apenas sua lealdade, mas até seus sentimentos viscerais entre os diversos personagens. Creio que estou parafraseando D. H. Lawrence, que disse certa vez que, para escrever um romance, você tem que ser capas de referendar meia dúzia de sentimentos e opiniões diferentes, conflituosos e contraditórios, com o mesmo grau de convicção, veemência e empatia. Então, talvez eu seja um pouco mais bem equipado do que outras pessoas para entender, do meu ponto de vista judaico-israelense, como é o sentimento de ser um palestino deslocado, um árabe palestino cuja terra natal foi tomada por ‘alienígenas de outro planeta’. p. 94
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Amos Oz (How to Cure a Fanatic)
“
A minha vida durante esses vinte e tal anos foi rio correndo, saltando, descendo montanhas, se espraiando nos vales, o rio rindo de si, da sua vida errante, do seu andar vagueante, o rio rindo farto, caudaloso, riomando, às vezes se apoucando nas suas miudezas, um fiozinho riando, riachando, o quase nonada, a se anular no seu corpo franzino, assim, corregando, a minha vida foi isso mesmo, o muito e pouco, a tempestade e a bonança, a vida não é o constante zizuezaguear? Mas, meu amigo, agora te conto esse rio correndo que sou eu, essas águas que não se cansam de parar, esse sempre em movimento em que vivo. Eu vou te contar meu vaguear com as minhas palavras , pensadas por mim mesmo, cavadas no chão movediço da memória.
”
”
Boaventura Cardoso
“
Assim era que era bom. A lembrança das coisices de ser criança: acordava e a vida acontecia; o sol me empurrava da cama e me dizia, vai que a vida começa comigo e minha luz é convosco; a vida, uma dentro da outra e um astro por todos; o sol, eu sou. Ao
”
”
Lucas Palhão (Microcontos Volume 2 (Portuguese Edition))
“
Voltou a questionar-se: as putas também amam? Se assim é, a única puta que anda aqui sou eu próprio que pago para oferecer o meu corpo. Mas pra quê? Se tudo é fingido, se a função é fazer vir o cliente, por que razão o cliente insiste em querer fazer com que a puta se venha, quando sabe que é tudo uma encenação, quando sabe que é ele próprio quem não é capaz de se vir?
”
”
Victor Eustáquio (O Carrossel de Lúcifer)
“
Raiz de orvalho
Sou agora menos eu
e os sonhos
que sonhara ter
em outros leitos despertaram
Quem me dera acontecer
essa morte
de que não se morre
e para um outro fruto
me tentar seiva ascendendo
porque perdi a audácia
do meu próprio destino
soltei ânsia
do meu próprio delírio
e agora sinto
tudo o que os outros sentem
sofro do que eles não sofrem
anoiteço na sua lonjura
e vivendo na vida
que deles desertou
ofereço o mar
que em mim se abre
à viagem mil vezes adiada
De quando em quando
me perco
na procura a raiz do orvalho
e se de mim me desencontro
foi porque de todos os homens
se tornaram todas as coisas
como se todas elas fossem
o eco as mãos
a casa dos gestos
como se todas as coisas
me olhassem
com os olhos de todos os homens
Assim me debruço
na janela do poema
escolho a minha própria neblina
e permito-me ouvir
o leve respirar dos objectos
sepultados em silêncio
e eu invento o que escrevo
escrevendo para me inventar
e tudo me adormece
porque tudo desperta
a secreta voz da infância
Amam-me demasiado
as cosias de que me lembro
e eu entrego-me
como se me furtasse
à sonolenta carícia
desse corpo que faço nascer
dos versos
a que livremente me condeno
”
”
Mia Couto (Raiz de Orvalho e Outros Poemas / O Fio das Missangas)
“
(...) É como aquele lago onde costumava patinar quando era miúdo - à distância, o gelo parecia muito brilhante e liso, mas, quando chegava mais perto, todas as irregularidades e marcas dos patins se tornavam visíveis. Eu sou assim, acho eu. Coberto com marcas de patins em que ninguém alguma vez repara.
”
”
Elle Kennedy (The Deal (Off-Campus, #1))
“
Tenho um amigo cuja companheira, Rosa, era babá para uma família chique do 16º arrondissement de Paris. Mas ela quer ser professora de espanhol. Ela deixa essa família, anunciando sua decisão. Infelizmente seu projeto profissional vai por água abaixo e ela precisa voltar a ser babá. Ela encontra uma nova família em busca de alguém, mas que gostaria de conversar com a família anterior para saber como Rosa se comporta com as crianças, conhecer suas «referências». Ela não pode telefonar para a família que ela abandonou dizendo que está prestes a começar um novo trabalho. Meu amigo me liga para pedir que eu interprete, ao telefone, a mãe da família do 16º. Eu nego — sou péssima atriz. É finalmente Lila, uma outra amiga, que faz o papel ao telefone e que mantém esse diálogo improvável: ela é mãe em uma família com muitos filhos que vive no 16º arrondissement, ela descreve a vida deles, as atividades das crianças, dá detalhes, agrada a interlocutora. Ela entra no jogo dessa vida que ela não tem e que inventa durante a conversa. Na vida, Lila faz filmes que tomam o real de empréstimo, mas que se parecem com ficções. Ao inserir cenas escritas e interpretadas em situações reais, ela busca produzir emoções que os métodos do documentário não conseguiriam obter sozinhos. Essa mistura reorganiza as relações sociais ou joga luz sobre elas de um jeito diferente. Seus personagens desempenham frequentemente atitudes combativas, que recusam as determinações. Essa história de babá é interessante pois coloca Lila em uma situação de escrita e de jogo que ela conhece bem, em que a palavra é colocada numa partilha entre realidade e ficção, abrindo assim pistas políticas. No
”
”
Clara Schulmann (Cizânias - Vozes de mulheres (Portuguese Edition))
“
Ando sem saber aonde vou, se para a luz radiante ou para a vergonha imensa. Eis o mal, pois tudo é mistério neste mundo. Quando eu estava mergulhado na mais profunda degradação (e quase sempre estive mergulhado), sempre li e reli esses versos sobre Ceres e a miséria humana. Eles me corrigiram? Não! Porque eu sou um Karamázov. Porque, quando caio no abismo, caio de cabeça, de propósito; até me agrada cair assim: vejo beleza nessa queda. E no meio da vergonha eu canto um hino. Sou mau, vil e degradado, mas beijo a ponta do
manto em que se envolve o meu Deus; sou o caminho do mal, mas também sou Seu filho, Senhor, e O amo, sinto a alegria sem a qual o mundo não poderia existir.
”
”
Fyodor Dostoevsky (The Brothers Karamazov)
“
Diga-me por que você prefere a mim — pediu — Doente e mesquinha do jeito que eu sou.
— Não consigo explicar com exatidão — Na verdade, não saberia explicar nem mesmo parcialmente; era um mistério. Ainda assim, era a verdade, sentia-o dentro de si.
”
”
Philip K. Dick (Clans of the Alphane Moon)
“
Os Maníacos, pensou, estão lutando contra a Terra; Mageboom, representando a CIA, está ocupado atirando em Hentman. Minha ex- esposa está lutando contra mim. E Hentman é meu inimigo. Logicamente, o que isto significa para mim? Deve ser possível formar uma equação racional, extraída desta confusão barroca; com certeza ela pode ser simplificada. Se os Maníacos estão à frente na ofensiva contra a Terra, e Hentman está lutando contra a Terra, então os Maníacos e Hentman são aliados. Hentman está contra mim, portanto sou inimigo dele e aliado da Terra. Mary está lutando contra mim e eu estou contra Hentman, assim Mary é aliada de Hentman, consequentemente inimiga da Terra. Entretanto, Mary lidera a força de trabalho dos psicólogos que pousaram aqui; ela veio como representante da Terra. Então, logicamente Mary é ao mesmo tempo inimiga e aliada da Terra.
Era impossível construir uma equação… havia muitos participantes na luta, cometendo desatinos demais, alguns, como no caso de Mary, por conta própria.
”
”
Philip K. Dick (Clans of the Alphane Moon)
“
As vidas não começam quando as pessoas nascem, se assim fosse, cada dia era um dia ganho, as vidas principiam mais tarde, quantas vezes tarde de mais, para não falar daquelas que mal tendo começado já se acabaram"
"Ninguém consegue viver para além do seu último dia"
"Invejar o que só parece ser, é trabalho perdido"
"Se uma pessoa, para gostar doutra, estivesse à espera de conhecê-la, não lhe chegaria a vida inteira."
"Não, eu não sou o nome que tenho"
- A Jangada de Pedra
”
”
José Saramago
“
Por vezes, não me sinto metade do fixe que as pessoas me julgam, e tenho a certeza de que, se alguém se desse ao trabalho de ficar mesmo a conhecer-me, provavelmente mudaria de opinião. É como aquele lago onde costumava patinar quando era miúdo - à distância, o gelo parecia muito brilhante e liso, mas, quando chegava mais perto, todas as irregularidades e marcas dos patins se tornavam visíveis. Eu sou assim, acho eu. Coberto de marcas de patins em que ninguém alguma vez repara.
”
”
Elle Kennedy (The Deal (Off-Campus, #1))
“
penso
que nunca
vou esquecer a morte
daqueles pássaros
ou a noite do Pedro em casa
corto um tomate
pra fazer o almoço
e penso que o tomate sou eu
a faca
é o Pedro, já cortei meu dedo assim uma porção de
vezes, com outras frutas também, mas o tomate
por ser vermelho
e ceder já no primeiro
corte,
principalmente.
às vezes
penso que só lembrarei dessas 2 coisas pro resto da
vida, a minha mão na cara do lucas, a mão do
Pedro na minha cara,
a cara do lucas e a cara do
Pedro, acima de qualquer
memória.
”
”
Aline Bei (O Peso do Pássaro Morto)
“
Definitivamente, fazia uma eternidade que eu não me sentia assim com alguém. Não resisto à minha vontade de agarrá-lo e prendê-lo a mim, quero me embolar nele. — Você é meu — grunhi, enlaçando seu quadril com as pernas e levando o olhar para ele. Seus olhos redondinhos e escuros viram duas curvinhas quando sorri, e isso derrete meu coração. — Eu sou. — É meu — repito, segurando seu rosto em minhas mãos e distribuindo beijos por cada cantinho, e me contendo para não morder. Minha linguagem de amor é nada mais do que uma explosão de carinho, e eu posso passar horas inteiras grudado nele, dizendo o quanto ele é lindo e perfeito. Não sei amar de outra forma que não seja essa — Meu Ethan. Tenho a plena noção de que pareço e soo como um maluco obcecado, não que eu esteja muito distante disso, no entanto, ele é meu e de mais ninguém.
”
”
GABBIE OLIVEIRA (NOSTALGIA (Volume 1) (Portuguese Edition))
“
Vocês acham que alguém vai se lembrar de nós? Quem se lembra daqueles que nunca nasceram, e mesmo assim ainda estão vivos? No sonho, sou um esqueleto dançando junto às biocortinas. Abro a boca e sorrio para mim mesmo com meu queixo saliente. Quero muito ser um bom funcionário, quero fazer boas escolhas. Mas como posso saber se estou seguindo o programa corretamente? Algumas ações podem ter consequências, que em alguns casos só se manifestarão num futuro tão distante que para mim se tornam insondáveis. Devo continuar trabalhando sabendo que minhas ações têm o potencial de neutralizar o programa? Ou o programa me deixa tão assoberbado que, não importa o que eu faça, sempre agirei de acordo com seus comandos? Serei eu a mão do programa? No entanto, existem erros nas atualizações, é bem verdade. Pode não ser essa a intenção do programa. Caso eu, sem me dar conta, execute uma ação que comprometa a boa execução do programa, não conseguirei deixar de me odiar por esse erro. Uma vez que não sei se estou agindo de forma comprometedora, porém, como poderei de fato saber se mereço ser odiado ou não? Devo me odiar antecipadamente? Onde posso descobrir quais ações são contrárias aos comandos do programa? A quem devo procurar para pedir perdão? É preciso submeter algum tipo de formulário? Gostaria de solicitar que providenciassem um material sobre quais ações requerem perdão. Pode ser um pensamento, por exemplo? Um pensamento demasiado ruim? Posso pensar que vocês estão sujeitos a falhas, que há algo de errado com vocês, mas então sinto raiva de mim mesmo e acho que o errado sou eu. Por que todos esses pensamentos me ocorrem se estou aqui sobretudo para executar uma tarefa essencialmente técnica? Por que tenho essas ideias se minha função é, antes de mais nada, aumentar a produtividade? Em que perspectiva esses pensamentos são "produtivos"? Ocorreu algum erro na atualização? Neste caso, gostaria de recomeçar do zero.
”
”
Olga Ravn (The Employees)
“
Assim, eu ia interrogando a mim mesmo, a respeito do que disse o oráculo, se devia mesmo permanecer como sou, nem sábio da sua sabedoria, nem ignorante da sua ignorância, ou ter ambas as coisas, como eles têm.
Em verdade, respondo a mim e ao oráculo que me convém ficar como sou.
”
”
Platão (Apologia - Platão: O Julgamento de Sócrates (Portuguese Edition))
“
— Você está me provocando, Senhorita O'Brien! — ele falou com o rosto próximo à porta do banheiro. — Como você é esperto, Senhor Cosa Nostra! Agora vai se arrumar para ser o meu namorado mafioso de mentirinha. — Cuidado com essa sua mania de me dar ordens, porque eu não sou bom em obedecer e você pode ter problemas com isso. — Ainda bem que você é assim, porque eu detesto homens previsíveis! Me surpreenda Senhor Cosa Nostra e eu te conto se gostei ou não!
”
”
Valéria Veiga (A JORNALISTA E O MAFIOSO (SWEET RISK Livro 6) (Portuguese Edition))
“
Assim como o céu, eu não sou, eu estou acontecendo.
”
”
Pedro Salomão (Eu tenho sérios poemas mentais)
“
Embora, honestamente? Por vezes, não me sinto metade do fixe que as pessoas me julgam, e tenho a certeza de que, se alguém se desse ao trabalho de ficar mesmo a conhecer-me, provavelmente mudaria de opinião. É como aquele lago onde costuma patinar quando era miúdo - à distância, o gelo parecia muito brilhante e liso, mas, quando chegava mais perto, todas as irregularidades e marcas dos patins se tornam visíveis. Eu sou assim, acho eu. Coberto com marcas de patins em que ninguém alguma vez repara.
”
”
Elle Kennedy (The Deal (Off-Campus, #1))
“
Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, permência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-la por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer principalmente.)
E nisto me comparo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo dos outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mas artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.
”
”
Carlos Drummond de Andrade (Corpo)
“
Pois é, sou eu. Um grande risco; enorme e desajeitado. Que, mesmo com uma grande chance de destruir tudo, só quer passar por perto, entende? Assim, de lado. E ser visto no céu de alguém.
”
”
Elayne Baeta (O Amor Não é Óbvio (Duologia Laranja-Forte, #1))
“
lembra quando você gritou que não havia lugar no mundo pra mim? que eu era desajustada demais pra ter um canto ou uma cidade no dia eu chorei agora agradeço pelo comentário acolhedor realmente não sou de lugar nenhum dispenso esse negócio de pertencer e prefiro as coisas assim bem livres voando por aí
”
”
Ryane Leão (Tudo Nela Brilha e Queima: Poemas de Luta e Amor)
“
Mas não consigo perdoar-me. E hei-de ser sempre assim até à morte. Tenho uma grande lista de coisas que fiz mal, de coisas que não devia ter feito. Porque é essa a questão. Não fazer batota, dê lá por onde der. Pode parecer que é um ideal fácil de seguir. E, para alguns, é fácil. Conheço algumas pessoas, não muitas, mas algumas, que fazem sempre o que devem fazer. Que são sempre boas pessoas, pessoas decentes. (..) Quando tens integridade, fazes o que deves fazer. Eu tenho muito pouca, é como se de mim ressumasse sempre qualquer coisa de... enfim, não propriamente de mórbido, mas qualquer coisa de baixo, de adulador, de rasteiro. Quando me vejo numa situação que exige prudência, que toda a gente sabe que exige prudência, carrego a fundo, a direito. E porquê? Porque só penso em mim, só me vejo a mim, transbordo de mim próprio por todos os lados. Sou capaz de ser bom para o outros, mas tenho de o ter decidido antecipadamente. Não me está no sangue. Não faz parte da minha natureza.
”
”
Karl Ove Knausgård (Min kamp 2 (Min kamp, #2))
“
Se a vida fosse algo estável, eu jamais precisaria da ajuda de Deus. No entanto, como não é assim que a coisa funciona, o busco o tempo todo. Sou grato pelas coisas que desconheço e por outras sobre as quais não tenho controle, pois elas me fazem correr na direção de Deus.
”
”
Francis Chan (Louco amor: Maravilhado com um Deus que nunca muda (Portuguese Edition))
“
Exatamente! A questão de Hachi já está resolvida para Satoru. Por isso, ele consegue ter lugar no coração para o Hachi e para mim. Mas para ti é diferente, não é, Kosuke? Só agora soubeste que o Hachi morreu. Podes ter absorvido a notícia racionalmente, mas ainda não o sentes de verdade.
Para superar a morte de um gato, é preciso passar pelo luto. Ouvindo assim, de repente, sobre a morte de um gato do qual não se tinha voltado a ter notícias pode-se pensar que é uma pena, mas é difícil sentir realmente a tristeza.
E o problema, Kosuke, é que queres que eu assuma o lugar do Hachi. Sinto muito. Eu, que sou amado por Satoru como Nana, não vou poder servir de substituto.
”
”
Hiro Arikawa (The Travelling Cat Chronicles)
“
Por uma missão primordial, que nunca consegui entender, fui destinado a "negar", ao passo que sou sinceramente bom e totalmente incapaz de negar. Não, sai por aí negando, sem negação não haveria crítica, e que revista poderia passar sem um "departamento de crítica" ? Sem crítica, só haveria Hosana. Mas, para viver, só o Hosana não basta, é preciso que esse Hosana passe pelo crisol da dúvida, e assim sucessivamente. Aliás, não me intrometo em nada disso, não fui eu quem o criei, logo, não respondo por isso. Mas ainda assim pegaram alguém para bode expiatório, obrigaram-no a escrever no departamento de crítica, e a vida começou. Nós compreendemos essa comédia: eu, por exemplo, exijo simples e francamente minha destruição. Não, vive, dizem, porque sem ti não haverá nada. Se tudo no mundo fosse sensato, nada aconteceria. Sem ti não haveria quaisquer acontecimentos, e é preciso que haja acontecimentos. E então trabalho a contragosto para que haja acontecimentos e crio o insensato cumprindo ordem. Os homens, a despeito de toda a sua indiscutível inteligência, tomam toda essa comédia por alguma coisa séria. Nisto reside sua tragédia. E então sofrem, é claro, mas...em compensação, vivem apesar de tudo, vivem na realidade, não na fantasia; porque o sofrimento é que é vida. Sem sofrimento, que prazer poderia haver em viver?
”
”
Fiodor Dostoïevski (The Brothers Karamazov)
“
a fome é uma boa razão para roubo, quem rouba por precisão tem cem anos de perdão, bem sei que o ditado não é assim, mas devia ser, se eu sou ladrão por ir roubar bolota, ladrão é também o dono dela, que nem fabricou a terra nem plantou a árvore e a podou e limpou
”
”
José Saramago (Levantado del suelo)
“
- Bom, espero que o mundo tenha aprendido a lição...
- (...) Não aprendeu. A gente esquece com facilidade. As gerações se sucedem. Cada governo escreve a História de acordo com as suas conveniências. E eu acho, meu caro, que cada um de nós tem nas suas mais remotas cavernas interiores um troglodita adormecido que, submetido a um certo tipo de estímulo, vem rapidamente à tona de nosso ser e se transforma num déspota totalitário capaz de todas as bestialidades. E nunca faltará um falso humanista para inventar uma teoria filosófica com o objetivo de coonestar todas as monstruosidades cometidas pelo ''homem das cavernas''.
- Não sou assim tão pessimista.
”
”
Erico Verissimo (Incidente em Antares)
“
Se eu tentasse ser bom para todos, para o mundo inteiro e para todas as criaturas que nele vivem, seria uma gota de água doce no mar salgado. Em outras palavras, um esforço perdido. Assim, decidi fazer um bem específico, um bem que não seria descartado. Eu sou bom para mim mesmo e para as pessoas próximas.
”
”
Geralt de Rívia - Batismo de Fogo
“
Mulher eu sou, espírito eu sou, tenho o infinito dentro de mim, não tenho começo e não tenho fim, eu sou assim. – Canção dos círculos de mulheres norte-americanas
”
”
Mirella Faur (Círculos Sagrados Para Mulheres Contemporâneas: Práticas, Rituais e Cerimônias Para o Resgate da Sabedoria Ancestral e a Espiritualidade Feminina)
“
Sou eu sem nenhuma ironia, sem nenhum desgosto, contente de não sentir sequer contentamento, menos ser o que é do que estar onde está, assim faz quem mais não deseja ou sabe que mais não pode ter, por isso só quer o que já era seu, enfim, tudo.
”
”
José Saramago (The Year of the Death of Ricardo Reis)
“
Num quarto estranho você tem que ficar vazio para dormir. E antes de estar vazio para dormir, o que é você. E quando você não está vazio, você não é. E quando você se enche de sono, nunca foi. Não sei o que sou. Não sei se sou ou não. Jewel sabe que ele é, porque ele não sabe que ele não sabe se é ou não. Ele não pode ficar vazio para dormir porque ele não é o que é e ele é o que não é. Além da parede não-iluminada posso ouvir a chuva modelar a carroça que é nossa, a carga que já não é mais deles que a derrubaram e serraram nem deles que a compraram e não é nossa também, que continua em nossa carroça no entanto, continua, já que apenas o vento e a chuva a modelam só para Jewel e eu, que não dormimos. E posto que o sono é não-ser e a chuva e o vento são 'era', a carroça não é. Mesmo assim a carroça 'é', porque quando a carroça é 'era', Addie Bundren não será. E Jewel 'é', então Addie Bundren deve ser. Então eu devo ser, ou eu não poderia ficar vazio para dormir num quarto estranho. E se eu ainda não estou vazio, eu 'sou'. Quantas vezes me deito debaixo da chuva numa casa estranha, pensando em minha casa.
”
”
William Faulkner (As I Lay Dying)
“
E acabamos fatalmente por desembocar na pergunta essencial, que se encontra por detrás de todas as outras quando todas as outras se afastam ou foram afastadas e que é, se me permitem, Quem Sou Eu? Interrogo-me e a resposta consiste, obcecantemente, invariavelmente, assim: Uma Merda.
”
”
António Lobo Antunes (Memoria de elefante)
“
– Ontem à noite – começou Ventarrón –, saí para dar uma volta, depois que você dormiu, e vi uma luz por aí, e me aproximei para olhar. Naquele lugar existe um hotel, no alto de uma pequena montanha, e num primeiro momento acreditei que tinha se incendiado, de tanto brilho. Mas não havia fogo algum. Desci e me aproximei das janelas. Também não era uma festa. Era uma luz radioativa, que pulsava, e pulsava tanto que sacudia todo o hotel… Uma luz vermelha, horrível, e a temperatura tinha subido vários milhares de graus… Como não tinha nenhuma intenção de me transformar num vento atômico, me afastei e fiquei olhando. Aquilo ia de mal a pior. Eu mesmo comecei a ficar assustado. E olhe que sou o mais eficaz que há numa fuga. Mas sei que existem sustos a distância dos quais não vale a escapatória. E então, de repente, o hotel inteiro caiu, derretido como um floco de neve ao sol. E lá estava, livre, aceso e horrível, o Monstro… o menino que não deveria ter nascido.
Sua voz, que já era grave, tinha adquirido uma ressonância de além-túmulo, muito pessimista. Suas últimas palavras fizeram um arrepio correr pelas costas de Delia.
– Que menino…? Que monstro…?
– Existe uma lenda que diz que um dia vai nascer, num hotel termal da zona, um menino dotado de todo o poder das transformações, um ser que será a cápsula de todos os ventos do mundo, o molde do vento, e, portanto, feio de espantar… pelo menos para mim, e para você, porque o que em mim está do lado de fora, nele está do lado de dentro, impulsionando todas as deformações. Já percebe que isso que eu estava vendo me dizia respeito.
– E o que aconteceu?
– Nada. Saí correndo e aqui estou. O problema é que agora o Monstro está solto e à sua procura.
– Eu? Por que eu?
– Porque assim diz a lenda – respondeu o vento, críptico. – E é óbvio que a lenda se transformou em realidade.
”
”
César Aira (Cómo me hice monja / La costurera y el viento)
“
Não sei explicar mas é como chegar na água
E saber nadar, muito mais ainda assim e por tudo
É sobre conseguir chegar naquilo que eu sou
E cada vez mais perto daquilo que sou com alegria
É uma camisa de força do avesso
Muito boa para o mergulho.
”
”
Bruna Beber (Ladainha)
“
Você não entende? Aqui é a minha casa. Grace é a minha casa... Só deixa eu me despedir dela... Amor? Se alguma parte de você sabe quem eu sou, por favor, escute essa parte. Te imploro. Eu não posso perdê-la assim, não desse jeito. Você prometeu que não iria embora
”
”
Lali Oliver (Heaven: Good Girls Bad Guys (Good Girls, #1))
“
EU SOU a energia purificadora e que preenche de vitaminas e nutrientes estes alimentos que agora penetram em meu templo de carne”. Andai sempre conscientes amados e amadas, para que possa qualificar e ordenar tudo ao vosso desejo de paz, união, harmonia e perfeição nessa Grande e Radiosa Presença EU SOU do Deus Criador!
Assim, conseguireis a aparência de Perfeição que vos dará o alento desejado para saber que "EU SOU” sempre a Beleza Governante! Se desejais que vossas formas se tornem mais simétricas passai vossas mãos por todo corpo, dos ombros até os pés, sentindo a Perfeição ou a simetria da forma que desejais. Através de vossas mãos fluirá a energia ou a qualidade do que desejais manifestar. Se praticardes isso com um sentimento profundo e verdadeiro, ficareis admirados dos resultados. Este é o maior adelgaçante do mundo.
”
”
Comte de Saint-Germain (O Livro de Ouro de Saint Germain: A Sagrada Alquimia do Eu Sou)
“
DISPERSÃO Perdi-me dentro de mim Porque eu era labirinto, E hoje, quando me sinto, É com saudades de mim. Passei pela minha vida Um astro doido a sonhar. Na ansia de ultrapassar, Nem dei pela minha vida… Para mim é sempre ontem, Não tenho amanhã nem hoje: O tempo que aos outros foge Cai sobre mim feito ontem. (O Domingo de Paris Lembra-me o desaparecido Que sentia comovido Os Domingos de Paris: Porque um domingo é familia, É bem-estar, é singeleza, E os que olham a beleza Não tem bem-estar nem familia). O pobre moço das ansias… Tu, sim, tu eras alguem! E foi por isso tambem Que te abismaste nas ansias. A grande ave dourada Bateu asas para os ceus, Mas fechou-as saciada Ao ver que ganhava os ceus. Como se chora um amante, Assim me choro a mim mesmo: Eu fui amante inconstante Que se traíu a si mesmo. Não sinto o espaço que encerro Nem as linhas que projecto: Se me olho a um espelho, érro— Não me acho no que projecto. Regresso dentro de mim, Mas nada me fala, nada! Tenho a alma amortalhada, Sequinha, dentro de mim. Não perdi a minha alma, Fiquei com ela, perdida. Assim eu choro, da vida, A morte da minha alma. Saudosamente recordo Uma gentil companheira Que na minha vida inteira Eu nunca vi… Mas recordo A sua bôca doirada E o seu corpo esmaecido, Em um halito perdido Que vem na tarde doirada. (As minhas grandes saudades São do que nunca enlacei. Ai, como eu tenho saudades Dos sonhos que não sonhei!…) E sinto que a minha morte— Minha dispersão total— Existe lá longe, ao norte, Numa grande capital. Vejo o meu ultimo dia Pintado em rôlos de fumo, E todo asul-de-agonia Em sombra e àlem me sumo. Ternura feita saudade, Eu beijo as minhas mãos brancas… Sou amor e piedade Em face dessas mãos brancas… Tristes mãos longas e lindas Que eram feitas pra se dar… Ninguem mas quís apertar… Tristes mãos longas e lindas… E tenho pena de mim, Pobre menino ideal… Que me faltou afinal? Um élo? Um rastro?… Ai de mim!… Desceu-me nalma o crepusculo; Eu fui alguem que passou. Serei, mas já não me sou; Não vivo, durmo o crepusculo. Alcool dum sôno outonal Me penetrou vagamente A difundir-me dormente Em uma bruma outonal. Perdi a morte e a vida, E, louco, não enlouqueço… A hora foge vivida, Eu sigo-a, mas permaneço… . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Castelos desmantelados, Leões alados sem juba… . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Paris—Maio de 1913.
”
”
Anonymous
“
— O que fará com uma espada? — Constância sentiu uma raiva súbita dele pela primeira vez desde que o conhecera.
— Lutarei — respondeu pausadamente — por você. Posso ser tão boa quanto qualquer um se me ensinar.
— Acha que pode ser? A maioria dos meus homens treina desde que eram garotos e, ainda assim, podem ser melhores do que são.
— Bom — ela disse, pegando sua mão ensanguentada —, eu não sou um homem.
”
”
Camila Jacomelli (CONSTÂNCIA (Trilogia Constância Livro 1) (Portuguese Edition))