Entre Quatro Paredes Quotes

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O grande desafio é continuar a gostar das coisas simples, entre quatro paredes, onde só acontecem coisas simples." (p. 83) "Ser parte de um acontecimento histórico cansa." (p. 152)
José Gardeazabal (Quarentena: Uma história de amor)
Seria ótimo, quem sabe, se pudéssemos passar um pouco mais dos dias e das noites sem nenhum obstáculo entre nós e os corpos celestes, se o poeta não falasse tanto à sombra de um telhado ou o santo não morasse entre quatro paredes por tanto tempo. As aves não cantam dentro das grutas, nem as pombas cuidam de sua inocência nos pombais.
Henry David Thoreau (Walden and Civil Disobedience)
Três coisas estão faltando. A primeira: você sabe por que livros como este são tão importantes? Porque têm qualidade. E o que significa a palavra qualidade? Para mim significa textura. Este livro tem poros. Tem feições. Este livro poderia passar pelo microscópio. Você encontraria vida sob a lâmina, emanando em profusão infinita. Quanto mais poros, quanto mais detalhes de vida fielmente gravados por centímetro quadrado você conseguir captar numa folha de papel, mais “literário” você será. Pelo menos, esta é a minha definição. Detalhes reveladores. Detalhes frescos. Os bons escritores quase sempre tocam a vida. Os medíocres apenas passam rapidamente a mão sobre ela. Os ruins a estupram e a deixam para as moscas. Entende agora por que os livros são odiados e temidos? Eles mostram os poros no rosto da vida. Os que vivem no conforto querem apenas rostos com cara de lua de cera, sem poros nem pelos, inexpressivos. Estamos vivendo num tempo em que as flores tentam viver de flores, e não com a boa chuva e o húmus preto. Mesmo os fogos de artifício, apesar de toda a sua beleza, derivam de produtos químicos da terra. No entanto, de algum modo, achamos que podemos crescer alimentando-nos de flores e fogos de artifício, sem completar o ciclo de volta à realidade. Você conhece a lenda de Hércules e Anteu, o gigantesco lutador cuja força era invencível desde que ele ficasse firmemente plantado na terra? Mas quando Hércules o ergueu no ar, deixando-o sem raízes, ele facilmente pereceu. Se não existe nessa lenda nenhuma lição para nós hoje, nesta cidade, em nosso tempo, então sou um completo demente. Bem, aí temos a primeira coisa de que precisamos. Qualidade, textura da informação. — E a segunda? — Lazer. — Ah, mas já temos muitas horas de folga. — Horas de folga, sim. Mas e tempo para pensar? Quando você não está dirigindo a cento e sessenta por hora, numa velocidade em que não consegue pensar em outra coisa senão no perigo, está praticando algum jogo ou sentado em algum salão onde não pode discutir com o televisor de quatro paredes. Por quê? O televisor é “real”. É imediato, tem dimensão. Diz o que você deve pensar e o bombardeia com isso. Ele tem que ter razão. Ele parece ter muita razão. Ele o leva tão depressa às conclusões que sua cabeça não tem tempo para protestar: “Isso é bobagem!”. — Somente a “família” é “gente”. — Como disse? — Minha mulher diz que os livros não são “reais”. — Graças a Deus que não. Você pode fechá-los e dizer: “Espere um pouco aí”. Você faz com eles o papel de Deus. Mas quem consegue se livrar das garras que se fecham em torno de uma pessoa que joga uma semente num salão de tevê? Ele dá a você a forma que ele quiser! É um ambiente tão real quanto o mundo. Ele se torna a verdade e é a verdade. Os livros podem ser derrotados com a razão. Mas com todo o meu conhecimento e ceticismo, nunca consegui discutir com uma orquestra sinfônica de cem instrumentos, em cores, três dimensões, e ao mesmo tempo estar e participar desses incríveis salões. Como você vê, meu salão não passa de quatro paredes de gesso. E veja. — Faber exibiu dois pequenos tampões de borracha. — Para minhas orelhas, quando ando nos jatos subterrâneos. — O Dentifrício Denham; eles não tecem, nem fiam — disse Montag, os olhos cerrados. — E para onde vamos? Os livros nos ajudariam? — Só se nos fosse dada a terceira coisa necessária. A primeira, como eu disse, é a qualidade da informação. A segunda, o lazer para digeri-la. E a terceira, o direito de realizar ações com base no que aprendemos da interação entre as duas primeiras.
Ray Bradbury (Fahrenheit 451)
Como pode notar, Deus parece uma expressão do intelecto das pessoas. Pessoas com baixa escolaridade, e inteligência, tendem a acreditar em um Deus intervencionista, autoritário. Pessoas mais inteligentes, tendem a ter um Deus mais universal, um Deus que tem mais o que fazer do que ficar xeretando o que as pessoas fazem entre quatro paredes.
Jorge Guerra Pires (Ciência para não cientistas: como ser mais racional em um mundo cada vez mais irracional (Vol. II: Religião) (Inteligência Artificial, Democracia, e Pensamento Crítico) (Portuguese Edition))
Deus evolui na história da humanidade, até chegar no Deus predominante hoje, que é monoteísta e muito preocupado com o que as pessoas fazem entre quatro paredes.
Jorge Guerra Pires (Ciência para não cientistas: como ser mais racional em um mundo cada vez mais irracional, vol. 1 (Bolsonarismo) (Inteligência Artificial, Democracia, e Pensamento Crítico) (Portuguese Edition))
Passar quatro dias e quatro noites em casa, vendo o carnaval passar; ou não vendo nem isso, mas entregue a uma outra e cifrada folia, que nesta quarta-feira de cinzas abre suas pétalas de cansaço, como se também tivéssemos pulado e berrado no clube. Não ligar a televisão, esquecer-se do rádio; deixar os locutores falando sozinhos, na ânsia de encher de discurso uma festa à base de movimento e de canto. Perceber apenas o grito trêmulo, trazido e levado pelo vento, de um samba que marca realidade lúdica sem nos convidar à integração. Beneficiar-se com a ausência de jornais, que prova a inexistência provisória do mundo como arquitetura de notícias. Ter como companheiro o irmão gato Crispim, exemplo de abstenção sem sacrifício, manual de silêncio e sabedoria, aventureiro que experimentou a vertigem da luta-livre nos telhados e homologa a invenção da poltrona. Penetrar no vazio do tempo sem obrigações, como num parque fechado, aproveitando a ausência de guardas, e descobrindo nele tudo que as tabuletas omitem. Aceitar a solidão; escolhê-la; desfrutá-la. Sorrir dos psiquiatras que falam em alienação do mundo e recomendam a terapêutica de grupo. Estimar a pausa como valor musical, o intervalo, o hiato. O instante em que a agulha fere o disco sem despertar ainda qualquer som. Andar de um quarto para outro sem ser à procura de objetos: achando-os. Descobrir, sem mescalina, as cores que a cor esconde; os timbres entrelaçados no ruído. Olhar para as paredes, ou melhor, olhar as paredes em torno dos quadros. Sentir a casa como um todo e como partículas densas, tensas, expectantes, acostumadas a viver sem nós, à nossa revelia, contra o nosso desdém. Habitar realmente a casa, quatro dias: como ilha, fortaleza, continente; infinito no finito; reconsiderar os livros, arrumá-los primeiro com método, depois com voluptuosidade, fazendo com que cada prateleira exija o maior tempo possível; verificar que antes é preciso tirar a poeira de um, remover a boba capa de celofane que envolve a encadernação de outro. Reler dedicatórias, abrir ao acaso livros de poetas que preferimos e que infelizmente não são os mais modernos, nem os mais célebres; copiar meia estrofe por onde corre arrepio verbal; separar volumes que não nos falam mais nada e que devem tentar seu destino em outras casas. Sentir chegada a hora dos álbuns de pintura com pouco ou nenhum texto, e dos volumes iconográficos que nos contam Paris ou a vida de Mallarmé. Viajar em fotografias; sentir-se imagem flutuando entre imagens; a terra domesticada em figura, tornada familiar sem perda de sua essência enigmática. Reconhecer que muitos livros comprados a duras penas, pedidos ao estrangeiro ou longamente minerados nos sebos, não têm mais do que essa oportunidade de comunicação durante o ano; deixar que fiquem a sós conosco e nos confiem seu segredo. Admitir a fome, sem exigência de horário, e matá-la com o que houver à mão; renunciar à idéia de almoço e jantar, com reverência ao sagrado direito que assiste a todos, inclusive e principalmente às cozinheiras, de brincarem o seu carnaval; achar mais gosto nessa comida, porque não é regulamentar nem é seguida de nada: todas as obrigações estão suspensas, e só valem as que soubermos traçar a nós mesmos. Descortinar na preguiça um espaço incomensurável, onde cabe tudo; não enchê-lo demais; devassá-lo à maneira de um explorador que não quer ser muito rico e tanto sente prazer em descobrir como em procurar. Assim vosso cronista passou o carnaval: sem fugir, sem brincar, divertido em seu canto umbroso.
Carlos Drummond de Andrade (A Bolsa e a Vida)
Não lhe bastava ser casada entre quatro paredes e algumas árvores; precisava do resto do mundo, também. E quando eu me vi embaixo, pisando as ruas com ela, parando, olhando, falando, senti a mesma coisa. Inventava passeios para que me vissem, me confirmassem e me invejassem.
Machado de Assis (Dom Casmurro)