Ser Sozinho Quotes

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Farto como estava de ser sozinho, aprendera que a família também se inventava.
Valter Hugo Mãe (O Filho de Mil Homens)
Amor. Amor. Amor, gostava de dizer esta palavra até gastá-la ainda mais. Amor, gostava de dizer esta palavra até perder ainda mais o seu sentido. Amor. Amor. Amor, até ser uma palavra que não significa nem sequer uma ilusão, uma mentira. Amor, amor, amor, nem sequer uma mentira, nem sequer um sentimento vago e incompreensível. Amor amor amor, até ser nem sequer uma palavra banal, nem sequer a palavra mais vulgar, nem sequer uma palavra. Amoramoramor, até ao momento em que alguém diz amor e ninguém vira a cabeça para ouvir, alguém diz amor e ninguém ouve, alguém diz amor e não disse nada. Sozinho, diante da campa. O amor é a solidão.
José Luís Peixoto (Uma Casa na Escuridão)
Se te converteres noutro sem deixares de ser tu, nunca mais te sentirás sozinho.
Juan Marsé (El amante bilingüe)
Eu e Antônio estamos casados há vinte e seis anos. Nem sempre é bom, nem sempre é ruim. Desconheço a balança que mede isso. É o que é, aceito, rejeito, mas não escolho mais tirar de mim esse amor entranhado, pertence a lugares em mim que não mando mais. Não fico tomando conta, podia ser assim, podia ser assado, medindo com régua o que falta. Não quero viver sem Antônio, me caso todos os dias com ele, acordo e caso, depois faço o café. Tem dia que ele tá chato de doer, largo pra lá, vai ser chato longe de mim e pronto. Ele melhora sozinho, depois piora e torna a melhorar, e a gente vai assim tomando distância e diminuindo distância. Caminhando.
Carla Madeira (Tudo é rio)
Ser poeta não é uma ambição minha. É a minha maneira de estar sozinho.
Alberto Caeiro
À noite, quando estou sozinho e a lua derrama as suas lágrimas, sei que o mundo voltaria a ser maravilhoso se estivesses aqui. Sem ti, o meu coração fica vazio, apenas com as lembranças que guarda. Tu, só tu, existes dentro de mim, à noite quando a lua chora.
Nora Roberts (Tears of the Moon (Gallaghers of Ardmore, #2))
O inferno não são os outros, pequena Halla. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exactamente em ti. Ser-se pessoa implica a tua mãe, as nossas pessoas, um desconhecido ou a sua expectativa. Sem ninguém no presente nem no futuro, o indivíduo pensa tão sem razão quanto pensam os peixes. Dura pelo engenho que tiver e perece como um atributo indiferenciado do planeta. Perece como uma coisa qualquer.
Valter Hugo Mãe (A Desumanização)
Um sistema de desvínculo: Boi sozinho se lambe melhor... O próximo, o outro, não é seu irmão, nem seu amante. O outro é um competidor, um inimigo, um obstáculo a ser vencido ou uma coisa a ser usada. O sistema, que não dá de comer, tampouco dá de amar: condena muitos à fome de pão e muito mais à fome de abraços.
Eduardo Galeano (The Book of Embraces)
O inferno não são os outros, pequena Halla. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exactamente em ti. Ser-se pessoa implica a tua mãe, as nossas pessoas, um desconhecido ou a sua expectativa.
Valter Hugo Mãe (A Desumanização)
Preferir o medo de estar com a pessoa errada por não ser capaz de lidar com o medo de ficar sozinho.
David Levithan (Every Day (Every Day, #1))
Apaguei todas as coisas que escrevi de manhã. Toda aquela besteira sobre ser verdadeiro comigo mesmo. Só escrevi aquilo porque pensei que soava bem. É claro que soava bem. Ficção sempre soa bem, mas não ajuda muito quando a realidade vem e joga você de cara no chão. Quando enrola sua língua, prendendo as palavras na sua cabeça. Quando deixa você almoçando sozinho.
Val Emmich (Caro Evan Hansen)
Aprendeu que a verdade não tem dono, que é duro demais existir e que ninguém precisa de ajudar ninguém a sofrer. O sofrimento vem sozinho, tem pernas, mais cedo ou mais tarde ele aparece; o que a gente tem de buscar é a alegria, essa esconde-se delicada na correria dos dias, não se oferece de pronto, quer ser encontrada, surpreendida, amada.
Carla Madeira (Tudo é rio)
Ser homossexual num ambiente britânico formal e legalmente avesso ao que era visto como um desvio da norma levou sem dúvida Forster a dar ao corpo seu devido valor. Não escondeu suas preferências sexuais dos amigos próximos mas nunca as assumiu publicamente; manteve um longo relacionamento com um homem casado embora ele mesmo, Forster... vivesse sozinho — ou com a mãe.
E.M. Forster (A Máquina parou)
Ia em direção ao ferry e quando cheguei à esquina parei a ver o que ele fazia. Foi a última vez que o vi e lembro-me muito claramente. Caminhou pelo molhe e parou junto ao poste de um candeeiro, a olhar para o mar. O único ser vivo numa cidade morta das Caraíbas: uma figura alta num fato gasto de Palm Beach, o seu único fato, agora cheio de pó e manchado de relva, com os bolsos largos, sozinho num molhe no fim do mundo imerso nos seus pensamentos
Hunter S. Thompson
A perfeição não é alcançada quando não há mais nada a ser incluído, mas sim quando não há mais nada a ser retirado." - Perfection is achieved not when there is nothing more to be added but when there is nothing more to be removed "Cada um que passa na nossa vida, passa sozinho, pois cada pessoa é única e nenhuma substitui outra. Cada um que passa na nossa vida, passa sozinho, mas não vai só nem nos deixa sós. Leva um pouco de nós mesmos, deixa um pouco de si mesmo. Há os que levam muito, mas há os que não levam nada. Essa é a maior responsabilidade da nossa vida, e a prova de que duas almas não se encontram ao acaso." - Every one that goes in our life passes alone, because each person is unique and no other substitutes. Every one that goes in our life passes alone, but will just not leave us alone. It takes a bit of ourselves, leaves a bit of himself. There are those who take a lot, but there are those who do not take anything. This is the greatest responsibility of our life, and the proof that two souls do not meet by chance.
Antoine de Saint-Exupéry
Na doença é que descobrimos que não vivemos sozinhos, mas sim encadeados a um ser de um reino diferente, de que nos separam abismos, que não nos conhece e pelo qual nos é impossível fazer-nos compreender: o nosso corpo. Qualquer assaltante que encontremos numa estrada, talvez consigamos torná-lo sensível ao seu interesse particular, se não à nossa desgraça. Mas pedir compaixão ao nosso corpo é discorrer diante de um polvo, para quem as nossas palavras não podem ter mais sentido que o rumor das águas, e com o qual ficaríamos cheios de horror de ser obrigados a viver.
Marcel Proust (The Guermantes Way)
Nós ainda somos moços, podemos perder algum tempo sem perder a vida inteira. Mas olhe para todos ao seu redor e veja o que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia. Não temos amado, acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não se entende porque não queremos passar por tolos. Temos amontoado coisas e seguranças por não nos termos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que já não tenha sido catalogada. Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos. Temos evitado cair de joelhos diante do primeiro de nós que por amor diga: tens medo. Temos organizado associações e clubes sorridentes onde se serve com ou sem soda. Temos procurado nos salvar mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes. Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura de ódio, de amor, de ciúme e de tantos outros contraditórios. Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa. Temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que nossa indiferença é angústia disfarçada. Temos disfarçado com o pequeno medo o grande medo maior e por isso nunca falamos no que realmente importa. Falar no que realmente importa é considerado uma gafe. Não temos adorado por termos a sensata mesquinhez de nos lembrarmos a tempo dos falsos deuses. Não temos sido puros e ingênuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer "pelo menos não fui tolo" e assim não ficarmos perplexos antes de apagar a luz. Temos sorrido em público do que não sorriríamos quando ficássemos sozinhos. Temos chamado de fraqueza a nossa candura. Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo isso consideramos a vitória nossa de cada dia.
Clarice Lispector (Aprendizaje o El libro de los placeres)
Você não deve agir de acordo com o seu entendimento, mas além dele; se você se atirar na insensatez, eu lhe darei meu entendimento. Não entender é o verdadeiro entender; não saber para onde vai, esse é o verdadeiro saber. Meu entendimento faz que você não entenda. Abraão abandonou a terra natal sem saber para onde ia. Ele se entregou à minha sabedoria, abriu mão de sua própria e, dessa maneira, seguiu o caminho certo, chegando ao caminho verdadeiro. Esse é o caminho da cruz, e você não consegue encontrá-lo sozinho; eu tenho de guiá-lo como se você fosse cego; por isso nem você, nem ser humano algum, nem nenhuma outra criatura, somente eu, eu mesmo, por meio de meu Espírito e de minha Palavra, posso ensinar o caminho a ser trilhado. Não é a obra que você escolher, nem o sofrimento que você preferir, mas é o caminho com que você depara não obstante a sua escolha, seu pensamento e seu desejo - e é aí que eu chamo, é aí que você se torna meu discípulo; é a hora oportuna, o seu Mestre chegou.
Martin Luther
Nunca te contei isso, pai, mas eu estava completamente bêbado uma noite, tinha acabado de vomitar em frente à estátua de Pasquino e não poderia estar mais atordoado. Aqui, encostado contra este muro, eu soube, por mais bêbado que estivesse, que essa, com Oliver me abraçando, era a minha vida, que tudo o que tinha acontecido antes com outras pessoas não era nem um esboço grosseiro ou a sombra de um rascunho do que estava acontecendo naquele momento. Dez anos depois, quando olho para este muro e este poste velho, estou com ele de novo e juro, nada mudou. Em trinta, quarenta, cinquenta anos não vai ser diferente. Conheci muitas mulheres e ainda mais homens em minha vida, mas o que está gravado neste muro ofusca todas as pessoas que conheci. Quando venho aqui, posso estar sozinho ou com pessoas, com vocês, por exemplo, mas sempre estou com ele. Se eu ficasse olhando para este muro durante uma hora, estaria com ele durante uma hora. Se eu falasse com este muro, ele responderia. — O que ele diria? — perguntou Miranda, completamente envolvida na ideia de Elio com o muro. — O que ele diria? Sem sombra de dúvida: “Procure por mim, me encontre”. — E o que você diz? — Eu digo a mesma coisa. “Procure por mim, me encontre”. E nós dois ficamos felizes. Agora você sabe.
André Aciman (Find Me (Call Me By Your Name, #2))
Não tinhas a mínima noção do que é o amor, Mayya? Não sentiste nada do que eu passei enquanto andava à volta da tua casa como um peregrino em volta da Caaba, uma, duas, sete vezes? Como pôde a casa ter espaço suficiente para abrigar toda a minha paixão? Como é que a sua única varanda aguentou comigo, ali parado, sozinho, sob o peso de tanto amor, sem se partir ou cair na rua de terra batida, para ser levada pela brisa para os céus de Deus? Como é que aquele quartinho suportou as toneladas de nuvens que eu aí guardava, só para poder caminhar sobre elas? Como é que as paredes se mantiveram imóveis e inabaláveis, sem tremer uma única vez com o tormento da minha insustentável felicidade? Mas tudo ficou no seu lugar, apesar de eu não ter lugar. As portas não saíram dos seus gonzos, apesar de o meu corpo abatido estar crivado pelas balas vivas do amor desesperado. As janelas não se partiram, ainda que as minhas asas batessem violentamente contra o vidro, com força suficiente para voar da janela da frente até à mancha mais distante no horizonte. A casa foi suficientemente grande para me conter, para sufocar o grito de desejo que ecoava dentro de mim. Como foi então possível, Mayya, que os teus olhos, fixos na tua máquina de costura, nunca conseguissem ver a dimensão imensa e tortuosa do meu amor, e o meu eu aprisionado?
Jokha Alharthi (Celestial Bodies)
Às vezes eu penso que, com metade do mundo em chamas, com tanta morte, tanta dor, cantar e sentir-se bem é um tipo especial de pecado. Mas aí penso, ué, mesmo antes da Escama do Dragão a maioria das vidas humanas era injusta, brutal, cheia de perda, tristeza e confusão. A maioria das vidas humanas era e é curta demais. A maioria das pessoas passou a vida faminta e descalça, fugindo de uma guerra aqui, de uma fome ali, de uma epidemia aqui, de uma enchente acolá. Mas as pessoas mesmo assim precisam cantar. Até mesmo um bebê que não come há dias para de chorar e olha em volta quando ouve alguém cantar de alegria. Quando você canta, é como dar de beber a quem tem sede. Uma gentileza. Isso faz você brilhar. A prova de que vocês têm importância está na sua canção e na maneira como vocês se acendem uns para os outros. Os outros podem cair e pegar fogo, eles vão cair e pegar fogo. Não existe nenhum de nós que não tenha visto isso acontecer. Mas aqui ninguém pega fogo. Aqui nós brilhamos. Uma alma assustada e sem fé é um combustível perfeito e o egoísmo é tão ruim quanto querosene. Quando alguém está com frio e você divide o seu cobertor, os dois ficam mais aquecidos do que teriam ficado sozinhos. Quando você dá remédio a um doente, a felicidade dele vira o seu remédio. Alguém decerto bem mais inteligente do que eu disse que o inferno são os outros. Eu digo que você está no inferno quanto deixa de dar a quem precisa porque não suporta ter menos. Nesse caso, está abrindo mão é da sua alma. É preciso cuidar uns dos outros, caso contrário viver é andar sobre cinzas, um fósforo pronto para ser aceso. Enfim, é nisso que eu acredito. E vocês, acreditam?
Joe Hill (The Fireman)
Os animais foram imperfeitos, compridos de rabo, tristes de cabeça. Pouco a pouco foram se compondo, fazendo-se paisagem, adquirindo manchas, graça, voo. O gato só gato apareceu completo e orgulhoso nasceu completamente terminado, caminha sozinho e sabe o que quer. O homem quer ser peixe e pássaro, a serpente queria ter asas, o cachorro é um leão desorientado, o engenheiro quer ser poeta, a mosca estuda para ser andorinha, o poeta tenta imitar a mosca, mas o gato só quer ser gato e todo gato é gato do bigode até o rabo, do pressentimento ao rato vivo, da noite até seus olhos de ouro. Não existe unidade como ele, nem têm a lua nem a flor tal contextura: é uma coisa só como o sol ou o topázio, e a elástica linhade seu contorno firme e sutil é como a linha da proa de uma nave. Seus olhos amarelos deixaram uma só ranhura para pôr as moedas da noite. Ó pequeno imperador sem orbe, conquistador sem pátria, mínimo tigre de salão, nupcial sultão do céu das telhas eróticas, o vento do amor na intempérie reclamas quando passas e pousas quatro pés delicados no solo, farejando, desconfiado de tudo que é terrestre, porque tudo é imundo para o imaculado pé do gato. Ó fera independente da casa, arrogante vestígio da noite, preguiçoso, ginástico, e alheio, profundíssimo gato, polícia secreta das moradas, talvez não sejas mistério, todo mundo sabe-te e pertences ao habitante menos misterioso, talvez todos o creiam, todos se creiam donos, proprietários, tios de gatos, companheiros, colegas, discípulos ou amigos de seu gato. Eu não. Eu não concordo. Eu não conheço o gato. Tudo sei, a vida e seu arquipélago, o mar e a cidade incalculável, a botânica, o gineceu com seus extravios, o mais e o menos da matemática, os funis vilcânicos do mundo, a casca irreal do crocodilo, a bondade ignorada do bombeiro, o atavismo azul do sacerdote, mas não posso decifrar um gato. Minha razão resvalou em sua indiferença, seus olhos têm números de ouro.
Pablo Neruda (Navegaciones y Regresos (Spanish Edition))
O tempo que nos resta "De súbito sabemos que é já tarde. Quando a luz se faz outra, quando os ramos da árvore que somos soltam folhas e o sangue que tínhamos não arde como ardia, sabemos que viemos e que vamos. Que não será aqui a nossa festa. De súbito chegamos a saber que andávamos sozinhos. De súbito vemos sem sombra alguma que não existe aquilo em que nos apoiávamos. A solidão deixou de ser um nome apenas. Tocamo-la, empurra-nos e agride-nos. Dói. Dói tanto! E parece-nos que há um mundo inteiro a gritar de dor, e que à nossa volta quase todos sofrem e são sós. Temos de ter, necessariamente, uma alma. Se não, onde se alojaria este frio que não está no corpo? Rimos e sabemos que não é verdade. Falamos e sabemos que não somos nós quem fala. Já não acreditamos naquilo que todos dizem. Os jornais caem-nos das mãos. Sabemos que aquilo que todos fazem conduz ao vazio que todos têm. Poderíamos continuar adormecidos, distraídos, entretidos. Como os outros. Mas naquele momento vemos com clareza que tudo terá de ser diferente. Que teremos de fazer qualquer coisa semelhante a levantarmo-nos de um charco. Qualquer coisa como empreender uma viagem até ao castelo distante onde temos uma herança de nobreza a receber. O tempo que nos resta é de aventura. E temos de andar depressa. Não sabemos se esse tempo que ainda temos é bastante. E de súbito descobrimos que temos de escolher aquilo que antes havíamos desprezado. Há uma imensa fome de verdade a gritar sem ruído, uma vontade grande de não mais ter medo, o reconhecimento de que é preciso baixar a fronte e pedir ajuda. E perguntar o caminho. Ficamos a saber que pouco se aproveita de tudo o que fizemos, de tudo o que nos deram, de tudo o que conseguimos. E há um poema, que devíamos ter dito e não dissemos, a morder a recordação dos nossos gestos. As mãos, vazias, tristemente caídas ao longo do corpo. Mãos talvez sujas. Sujas talvez de dores alheias. E o fundo de nós vomita para diante do nosso olhar aquelas coisas que fizemos e tínhamos tentado esquecer. São, algumas delas, figuras monstruosas, muito negras, que se agitam numa dança animalesca. Não as queremos, mas estão cá dentro. São obra nossa. Detestarmo-nos a nós mesmos é bastante mais fácil do que parece, mas sabemos que também isso é um ponto da viagem e que não nos podemos deter aí. Agora o tempo que nos resta deve ser povoado de espingardas. Lutar contra nós mesmos era o que devíamos ter aprendido desde o início. Todo o tempo deve ser agora de coragem. De combate. Os nossos direitos, o conforto e a segurança? Deixem-nos rir... Já não caímos nisso! Doravante o tempo é de buscar deveres dos bons. De complicar a vida. De dar até que comece a doer-nos. E, depois, continuar até que doa mais. Até que doa tudo. Não queremos perder nem mais uma gota de alegria, nem mais um fio de sol na alma, nem mais um instante do tempo que nos resta." Miguel Gonçalves
eu
DATILOGRAFIA Traço, sozinho, no meu cubículo de engenheiro, o plano, Firmo o projeto, aqui isolado, Remoto até de quem eu sou. Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro, O tique-taque estalado das máquinas de escrever. Que náusea da vida! Que abjeção esta regularidade! Que sono este ser assim! Outrora, quando fui outro, eram castelos e cavaleiros (Ilustrações, talvez, de qualquer livro de infância), Outrora, quando fui verdadeiro ao meu sonho, Eram grandes paisagens do Norte, explícitas de neve, Eram grandes palmares do Sul, opulentos de verdes. Outrora. Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro, O tique-taque estalado das máquinas de escrever. Temos todos duas vidas: A verdadeira, que é a que sonhamos na infância, E que continuamos sonhando, adultos, num substrato de névoa; A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros, Que é a prática, a útil, Aquela em que acabam por nos meter num caixão. Na outra não há caixões, nem mortes, Há só ilustrações de infância: Grandes livros coloridos, para ver mas não ler; Grandes páginas de cores para recordar mais tarde. Na outra somos nós, Na outra vivemos; Nesta morremos, que é o que viver quer dizer; Neste momento, pela náusea, vivo na outra... Mas ao lado, acompanhamento banalmente sinistro, Ergue a voz o tique-taque estalado das máquinas de escrever.
Fernando Pessoa (Fernando Pessoa - Poesia Completa de Álvaro de Campos (Portuguese Edition))
A solidão verdadeira exige a distância não apenas dos amigos e da família, mas também do país e da língua materna. É preciso ser estrangeiro e não entender nada ao redor para estar de fato sozinho.
Ricardo Lísias (Divórcio)
inventamos deus porque temos de nos policiar uns aos outros, é verdade. é tão mais fácil gerir os vizinhos se compactuarmos com a hipótese de existir um indivíduo sem corpo que atravessa as casas e escuta tudo quanto dizemos e vê tudo quanto fazemos. é tão mais fácil se esta ideia for vendida a cada pessoa com a agravante de se lhe dizer que, um dia, quando morrer, esse mesmo sinistro ser virá ao seu encontro para o punir ou premiar pelo comportamento que houver tido em todo o tempo que gastou. e a comunidade respira mais de alívio por saber que estamos todos policiados da melhor maneira, temos um polícia dentro de nós, um que sendo só nosso também é dos outros e, a cada passo, pode debitar-nos ou acusar-nos e terminar o nosso percurso com facilidade. eu sei que a humanidade inventa deus porque não acredita nos homens e é fácil entender por quê. os homens acreditam em deus porque não são capazes de acreditar uns nos outros. e quanto mais assim for, quanto menos acreditarmos uns nos outros outros, mais solicitamos o policiamento, e se o policiamento divino entre em crise, porque as mentes se libertam e o jugo glutão da igreja já não funciona, é preciso que se solicite do estado esse policiamento. que medo o de voltarmos ao tempo de uma polícia para os costumes e convicções. que medo se voltarmos a temer os vizinhos e os vizinhos nos puderem entregar por ideias contrárias. que medo se nos entra outro filho da puta no poder, a censurar tudo quanto se diga e a mandar que pensemos como pensa e façamos como diz que faz. que medo de tudo se em tudo quanto os homens fazem vai a vontade torpe de ultrapassar o outro, poder mais do que o outro, convencer o outro de que fica bem no andar de baixo e depois subir, subir o mais sozinho possível, porque ganhar acompanhado não satisfaz ninguém. estamos a fazer tudo errado agora, sem valores, sem medo da igreja, sem um fascismo que nos regule o voluntarismo. estamos como que sozinhos da maneira errada. mais sozinhos do que nunca, a ver a coisa passar sem sabermos muito bem em quem confiar. e nisto, é verdade, pressupomos que todos são bons homens, mas a cabeça de alguns, se não a de todos, tem de estar a cozinhar muito do esquisito que para aí acontece e se sente. muito do esquisito que nos impede, mais e mais, de acreditar nos homens.
Valter Hugo Mãe
As lágrimas de Prajapati Segundo a sabedoria dos mitos, o deu Prajapati nasceu do turbilhão das águas primordiais, chorando convulsivamente por estar sozinho e por não saber ao certo a razão por que tinhas vindo ao mundo. Das lágrimas que verteu nesse choro convulsivo de criança abandonada à sua sorte nasceu a Terra e muitos dos seres que passaram a povoá-la. Mas lágrimas houve que foram arrastadas pelo vento para muito longe. Dessas lágrimas nasceu o céu e nasceram as nuvens. Foi também das suas lágrimas que nasceram as pessoas e os espíritos, a noite e o dia, as estações do ano e também a morte, a única entidade capaz de pôr fim a muitos dos seres nascidos das copiosas lágrimas de Prajapati. Diz-se que, ainda hoje, sempre que uma criança acabada de nascer irrompe num violento choro, há quem se interrogue sobre a possibilidade de ser um descendente de Prajapanti, com poderes bastantes para transformar as lágrimas da solidão primordial numa miríade de novos seres terrestres e celestes.
José Jorge Letria (Lendas e contos indianos)
Eu sempre acreditei que fui feito para ser amado em segredo, como uma verdade que se você esconder por tempo suficiente ela deixará de ser real. Embora tivesse convicção que nasci para os holofotes, ninguém queria segurar a minha mão diante da plateia, portanto, me conformei com o meu monólogo solitário e com as canções dedicadas aos amores que vivi sozinho.
Matt Lima (6 Desejos de Natal (Portuguese Edition))
PERDIDO OU SOZINHO? (...) Então perdida, porque sozinha parece algo permanente, e o que é perdido pode ser encontrado.
Amy Harmon (Making Faces)
talvez ela não seja apenas outra pessoa para brincar. Talvez ela seja mais. Talvez ela tenha sido feita para mim. Eu pensei que tinha que fazer tudo sozinho. Mas talvez devêssemos ser ótimos juntos.
Stylo Fantome (Church (Church, #1))
Quando uma pessoa está sozinha, quando uma pessoa vive sozinha e ainda para mais no estrangeiro, repara demasiado no caixote do lixo, porque pode chegar a ser a única coisa com a qual mantém uma relação constante, ou melhor, uma relação de continuidade. Cada saco de plástico preto, novo, brilhante, liso, por estrear, produz o efeito da limpeza absoluta e da infinita possibilidade. Quando o colocamos no caixote, à noite, é já a inauguração ou a promessa do novo dia: tudo pode acontecer. Esse saco, esse caixote, são por vezes as únicas testemunhas do que acontece durante a jornada de um homem sozinho, e é ali que se vão depositando os restos, os rastos desse homem ao longo do dia, a sua metade descartada, o que decidiu não ser nem tomar para si, o negativo do que comeu, do que bebeu, do que fumou, do que utilizou, do que comprou, do que produziu e do que veio até si. No fim do dia, o saco, o caixote, estão cheios e são confusos, mas ele viu-o crescerem, transformarem-se, formarem-se numa amálgama indiscriminada da qual, no entanto, esse homem não apenas conhece a explicação e a ordem, como a própria e indiscriminada amálgama é a ordem e a explicação do homem. O saco e o caixote são a prova de que esse dia existiu e se foi acumulando e foi ligeiramente diferente do dia anterior e do que se lhe seguirá, embora também seja uniforme e o nexo visível entre ambos. É o único registo, a única constância ou prova do transcorrer desse homem, a única obra que esse homem verdadeiramente levou a cabo. São o fio da vida, e também o seu relógio. De cada vez que uma pessoa se aproxima do caixote e atira algo lá para dentro, volta a ver e a ter contacto com as coisas que atirou nas horas prévias, e é isso que lhe dá um sentido de continuidade. (...) Tudo se vai apertando e concentrando, cobrindo e confundindo, convertendo-se assim no traço percetível - material e sólido - do desenho dos dias da vida de um homem. Fechar e dar um nó no saco e deitá-lo fora significa comprimir e encerrar a jornada, que talvez apenas tenha sido pontuada por essas ações, a ação de deitar fora detritos e cascas, a ação de prescindir, a ação de escolher, a ação de discernir o que é inútil. O resultado do discernimento é essa obra que impõe o seu próprio fim: quando o caixote transborda pode dar-se por concluída, e então, mas só então, o seu conteúdo é desperdício.
Javier Marías (All Souls)
Sempre me pareceu um excesso de ingenuidade pensar que alguém - porque nos ama, isto é, porque sozinho decidiu amar-nos transitoriamente e depois no-lo anunciou - se vai comportar connosco de um modo diferente daquele que vemos comportar-se com os outros, como se nós não estivéssemos destinados a ser os outros logo após a solitária decisão e o anúncio do outro, como se na realidade não fôssemos sempre também os outros além de nós.
Javier Marías (All Souls)
Escrever sobre si mesmo e sua vida (mesmo que só anotações rápidas) é um imenso privilégio, e esse hábito pode ser incrivelmente libertador. No fundo, um diário é uma declaração de que nossa voz importa. Se a sociedade convenceu você do contrário — de que exprimir suas necessidades é egoísmo, de que sua principal função é cuidar dos outros —, então declarar sua verdade pode ser um ato poderoso. É um modo de dizer: “Sou mais do que um coadjuvante de narrativas alheias; sou o herói desta história, e tudo o que faço, digo, penso e sinto tem valor.” E aprender a encontrar sua voz quando se está sozinho tornará mais fácil encontrá-la quando estiver em público.
Rachel Wilkerson Miller (Dot Journaling: A Practical Guide: How to Start and Keep the Planner, To-Do List, and Diary That’ll Actually Help You Get Your Life Together)
Se quiser ir rápido vá sozinho, se quiser ir longe vá em grupo.' É isso: para irmos longe precisamos ir em bando. Mas, além de ser uma necessidade, colaborar é uma grande dificuldade. A maneira tradicional como imaginamos a colaboração é uma utopia - um trabalho harmonioso em equipe somente com pessoas que pensam e agem de forma semelhante. No mundo, assim como na natureza, as conexões se dão constantemente entre "diferentes", que se complementam e são responsáveis por fazer o todo. O conflito é inerente ao processo.
Andre Carvalhal (Como salvar o futuro: Ações para o presente (Portuguese Edition))
Passar quatro dias e quatro noites em casa, vendo o carnaval passar; ou não vendo nem isso, mas entregue a uma outra e cifrada folia, que nesta quarta-feira de cinzas abre suas pétalas de cansaço, como se também tivéssemos pulado e berrado no clube. Não ligar a televisão, esquecer-se do rádio; deixar os locutores falando sozinhos, na ânsia de encher de discurso uma festa à base de movimento e de canto. Perceber apenas o grito trêmulo, trazido e levado pelo vento, de um samba que marca realidade lúdica sem nos convidar à integração. Beneficiar-se com a ausência de jornais, que prova a inexistência provisória do mundo como arquitetura de notícias. Ter como companheiro o irmão gato Crispim, exemplo de abstenção sem sacrifício, manual de silêncio e sabedoria, aventureiro que experimentou a vertigem da luta-livre nos telhados e homologa a invenção da poltrona. Penetrar no vazio do tempo sem obrigações, como num parque fechado, aproveitando a ausência de guardas, e descobrindo nele tudo que as tabuletas omitem. Aceitar a solidão; escolhê-la; desfrutá-la. Sorrir dos psiquiatras que falam em alienação do mundo e recomendam a terapêutica de grupo. Estimar a pausa como valor musical, o intervalo, o hiato. O instante em que a agulha fere o disco sem despertar ainda qualquer som. Andar de um quarto para outro sem ser à procura de objetos: achando-os. Descobrir, sem mescalina, as cores que a cor esconde; os timbres entrelaçados no ruído. Olhar para as paredes, ou melhor, olhar as paredes em torno dos quadros. Sentir a casa como um todo e como partículas densas, tensas, expectantes, acostumadas a viver sem nós, à nossa revelia, contra o nosso desdém. Habitar realmente a casa, quatro dias: como ilha, fortaleza, continente; infinito no finito; reconsiderar os livros, arrumá-los primeiro com método, depois com voluptuosidade, fazendo com que cada prateleira exija o maior tempo possível; verificar que antes é preciso tirar a poeira de um, remover a boba capa de celofane que envolve a encadernação de outro. Reler dedicatórias, abrir ao acaso livros de poetas que preferimos e que infelizmente não são os mais modernos, nem os mais célebres; copiar meia estrofe por onde corre arrepio verbal; separar volumes que não nos falam mais nada e que devem tentar seu destino em outras casas. Sentir chegada a hora dos álbuns de pintura com pouco ou nenhum texto, e dos volumes iconográficos que nos contam Paris ou a vida de Mallarmé. Viajar em fotografias; sentir-se imagem flutuando entre imagens; a terra domesticada em figura, tornada familiar sem perda de sua essência enigmática. Reconhecer que muitos livros comprados a duras penas, pedidos ao estrangeiro ou longamente minerados nos sebos, não têm mais do que essa oportunidade de comunicação durante o ano; deixar que fiquem a sós conosco e nos confiem seu segredo. Admitir a fome, sem exigência de horário, e matá-la com o que houver à mão; renunciar à idéia de almoço e jantar, com reverência ao sagrado direito que assiste a todos, inclusive e principalmente às cozinheiras, de brincarem o seu carnaval; achar mais gosto nessa comida, porque não é regulamentar nem é seguida de nada: todas as obrigações estão suspensas, e só valem as que soubermos traçar a nós mesmos. Descortinar na preguiça um espaço incomensurável, onde cabe tudo; não enchê-lo demais; devassá-lo à maneira de um explorador que não quer ser muito rico e tanto sente prazer em descobrir como em procurar. Assim vosso cronista passou o carnaval: sem fugir, sem brincar, divertido em seu canto umbroso.
Carlos Drummond de Andrade (A Bolsa e a Vida)
A jornada da vulnerabilidade não foi feita para se percorrer sozinho. Nós precisamos de apoio. Precisamos de pessoas que nos ajudem na tentativa de trilhar novas maneiras de ser e não nos julguem. Precisamos de uma mão para nos levantar quando cairmos (e se você se entregar a uma vida corajosa, levará alguns tombos).
Brené Brown (A coragem de ser imperfeito: Como aceitar a própria vulnerabilidade, vencer a vergonha e ousar ser quem você é)
Se a solidão costuma ser um problema, não é porque ficamos sozinhos de fato, mas sim porque podemos ficar mal acompanhados: por nós mesmos.
Ana Suy (A gente mira no amor e acerta na solidão)
Sempre me pareceu um excesso ingenuidade pensar que alguém- porque nos ama, isto é, porque sozinho decidiu amar-nos transitoriamente e depois no-lo anunciou - se vai comportar connosco de um modo diferente daquele que vemos comportar-se com os outros, como se nós não estivéssemos destinados a ser os outros logo após a solitária decisão e o anúncio do outro, como se na realidade não fôssemos sempre também os outros além de nós.
Javier Marías (All Souls)
Veja bem, eu sei que parece no mínimo incoerente duas mulheres que apresentam podcasts semanais se definirem como introvertidas, mas, apesar de incoerência ser quase meu sobrenome, a confusão está mais relacionada ao verdadeiro significado de introversão. O primeiro entendimento errado é achar que necessariamente tem a ver com timidez. Um introvertido gosta de estar sozinho e fica emocionalmente esgotado depois de passar muito tempo com outras pessoas. Uma pessoa tímida não quer necessariamente ficar sozinha, mas o medo e a ansiedade servem como verdadeiros muros para a interação.
Marcela Ceribelli (Aurora: O despertar da mulher exausta)
O sofrimento vem sozinho, tem pernas, mais cedo ou mais tarde ele aparece; o que a gente tem de buscar é a alegria, essa se esconde delicada na correria dos dias, não se oferece de pronto, quer ser encontrada, surpreendida, amada.
Clara Madeira
— Quer saber por que o seu pai não fica por perto? As lágrimas fazem meu nariz arder, mas assinto. Essa é a pergunta que eu nunca deixei de me fazer, por mais que doa. — Porque você vê como ele é — diz Miles. — E o seu pai não consegue suportar isso. E o Peter é a mesma merda com figurino diferente, tão entediado com ele mesmo que se convenceu de que estar com alguém como a Petra iria transformar ele em outra pessoa, sem precisar, sei lá, ter coragem pra tentar tomar ácido. — Ele ficou entediado comigo, Miles — retruco. — Se tivesse a ver com você — insiste ele —, o Peter poderia ter terminado o noivado. Em vez de mudar a vida toda. O que aconteceu tem a ver com ele. Eu já fui esse cara várias vezes, com várias pessoas que eu não merecia. É fácil ser amado por quem nunca viu você ferrar com tudo. Com quem você nunca tem que se desculpar, e que ainda acha que todos as suas “loucuras” são um charme. Miles faz uma pausa antes de continuar. — É fácil estar perto de pessoas que não te conhecem. E, assim que alguém começa a te decifrar, assim que você deixa de ser perfeito, é mais fácil fugir, passar para a próxima pessoa. Encontrar alguém novo com quem você possa ser descolado, divertido, descontraído. — Então é isso? — Minha voz sai embargada. — Eu faço as pessoas se sentirem na pior versão delas. — Daphne, não. — Miles me puxa para junto dele e enfia o rosto no meu pescoço. — Meu Deus, não. — Quando ele recua, vejo covinhas de tensão marcando o maxilar com a barba por fazer. — Escuta. Eu sempre quis ser essa pessoa divertida, fácil de lidar, sem bagagem, mesmo com a Petra. Mas depois de um tempo alguém finalmente vê a gente como a gente é, ou não vê, e as duas possibilidades são uma merda. Porque, se a pessoa vê a gente de verdade e não somos o que ela esperava, ela cai fora. E, se ela nunca vê a gente de verdade... é pior. Porque aí estamos completamente sozinhos. Uma nova pausa. — E eu amava a Petra — continua então —, mas no fundo sabia que, assim que as coisas parassem de ser divertidas, ela iria embora. E ela foi. Encontrou alguma coisa mais romântica, mais perfeita, só mais. Acho que você é a primeira pessoa que me vê de verdade. Que vai além do que eu quero que as pessoas vejam. Miles fica em silêncio por mais um instante. — Você faz as pessoas de quem você gosta se sentirem como... — Ele faz uma pausa. — Como se você quisesse tudo delas. Não só as partes boas. E isso é assustador pra alguém que passou a vida inteira evitando essas outras partes de si mesmo. — Eu não quero fazer as pessoas fugirem de mim apavoradas — digo, a garganta doendo. Miles balança a cabeça. — Vale a pena ficar assustado. Acredita em mim. Por você, vale a pena.
Emily Henry (Funny Story)
Tenho um amigo cuja companheira, Rosa, era babá para uma família chique do 16º arrondissement de Paris. Mas ela quer ser professora de espanhol. Ela deixa essa família, anunciando sua decisão. Infelizmente seu projeto profissional vai por água abaixo e ela precisa voltar a ser babá. Ela encontra uma nova família em busca de alguém, mas que gostaria de conversar com a família anterior para saber como Rosa se comporta com as crianças, conhecer suas «referências». Ela não pode telefonar para a família que ela abandonou dizendo que está prestes a começar um novo trabalho. Meu amigo me liga para pedir que eu interprete, ao telefone, a mãe da família do 16º. Eu nego — sou péssima atriz. É finalmente Lila, uma outra amiga, que faz o papel ao telefone e que mantém esse diálogo improvável: ela é mãe em uma família com muitos filhos que vive no 16º arrondissement, ela descreve a vida deles, as atividades das crianças, dá detalhes, agrada a interlocutora. Ela entra no jogo dessa vida que ela não tem e que inventa durante a conversa. Na vida, Lila faz filmes que tomam o real de empréstimo, mas que se parecem com ficções. Ao inserir cenas escritas e interpretadas em situações reais, ela busca produzir emoções que os métodos do documentário não conseguiriam obter sozinhos. Essa mistura reorganiza as relações sociais ou joga luz sobre elas de um jeito diferente. Seus personagens desempenham frequentemente atitudes combativas, que recusam as determinações. Essa história de babá é interessante pois coloca Lila em uma situação de escrita e de jogo que ela conhece bem, em que a palavra é colocada numa partilha entre realidade e ficção, abrindo assim pistas políticas. No
Clara Schulmann (Cizânias - Vozes de mulheres (Portuguese Edition))
O sofrimento vem sozinho, tem pernas, mais cedo ou mais tarde ele aparece; o que a gente tem de buscar é a alegria, essa se esconde delicada na correria dos dias, não se oferece de pronto, quer ser encontrada, surpreendida, amada.
Carla Madeira (Tudo é Rio)
Sou quase um cara, não tenho cor, nem padrinho. Nasci no mundo, sou sozinho. Não tenho pressa, não tenho plano, não tenho dono. Tentei ser crente, mas Cristo não está interessado nas bichas bravas, analfabetas e pretas como eu.
Andrea Alejandro Freire (Camino de letras que desaparece en un sobre)
Sozinho dentro do estúdio, pouca luz. Só eu, meus fones de ouvido, meu teclado, meu computador, um papel e uma caneta. O microfone e alguns outros itens eram dispensáveis para o intuito daquele dia, mas estavam ali ainda assim. Aquele era o meu modus operandi, era como eu me sentia confortável com a minha arte, como eu sentia o ritmo ser conduzido através do meu corpo, como meu coração seguia cada nota do arranjo.
Letícia Kartalian (Algum tipo de amor)
Tenho um dragão que mora comigo. Não, isso não é verdade. Não tenho nenhum dragão. E, ainda que tivesse, ele não moraria comigo nem com ninguém. Para os dragões, nada mais inconcebível que dividir seu espaço - seja com outro dragão, seja com uma pessoa banal feito eu. Ou invulgar, como imagino que os outros devam ser. Eles são solitários, os dragões. Quase tão solitários quanto eu me encontrei, sozinho neste apartamento, depois de sua partida. Digo quase porque, durante aquele tempo em que ele esteve comigo, alimentei a ilusão de que meu isolamento para sempre tinha acabado. E digo ilusão porque, outro dia, numa dessas manhãs áridas da ausência dele, felizmente cada vez menos freqüentes (a aridez, não a ausência), pensei assim: Os homens precisam da ilusão do amor da mesma forma que precisam da ilusão de Deus. Da ilusão do amor para não afundarem no poço horrível da solidão absoluta; da ilusão de Deus, para não se perderem no caos da desordem sem nexo. Isso me pareceu grandiloqüente e sábio como uma ideia que não fosse minha, tão estúpidos costumam ser meus pensamentos. E tomei nota rapidamente no guardanapo do bar onde estava. Escrevi também mais alguma coisa que ficou manchada pelo café. Até hoje não consigo decifrá-la. Ou tenho medo da minha - felizmente indecifrável - lucidez daquele dia.
Caio Fernando Abreu (Os Dragões não Conhecem o Paraíso)
Há tipos extraordinários sob roupagens subtraídas a mitos vulgares. Parecem destinar-se à opulência, desenvolver-se ao sabor das experiências, revestir-se das forças mais complexas, e afinal não se moveram um passo dos berços, não deixaram de segurar a mão terrível da mãe, e de esperar uma revelação que não é deste mundo. Paramentam-se com os belos trapos, aspiram e rejeitam todas as oportunidads, sugam o sangue dos amantes, endividam-se com a morte, rivalizam com uma geração inteira de vencedores, de inveções, planos, paisagens e conflitos geniais. Um dia são surpreendidos por um estranho medo, começam a sentir a fobia dos recintos fechados, a ter convulsões e agonias, a querer ver gente reunida e a julgar-se perseguidos ou que os inoram propositadamente. Não são capazes de passar uma hora sozinhos, de meditar sobre um livro, ainda que o recitem de cor; procuram os excitantes e preferem as companhias ruidosas, não são amigos de ninguém, são espectadores de toda a gente. Certo dia estão cadavéricos e prostrados, com rugas precoces e olhos fundos, outras vezes apresentam-se cheios duma mocidade impertinente, afrontando até as razões do coração com uma espécie de vandalismo insuportável. Esta irregularidade marca em geral o princípio duma neurastenia, e em breve se desenha um surto de razoabilidade, parecem de repente as pessoas mais coerenttes do mundo, aprofundam a alma, voltam-se para as coisas superiores, abeiram-se dos problemas sérios, discutem sociologia e política. Mas ainda isso é uma farsa; apenas buscam alimento para o tédio, para a doença da vontade, para o tremendo desencontro que têm de viver entre a sua inaptidão natural e a exigência duma sociedade em que estão sempre intrusos. Essa ideia de serem intrusos na família, na profissão, nos contactos humanos, acompanha-os por toda parte. Vivem num estado de alarme contínuo, encolerizam-se quando deviam ser fleumáticos, mostram-se passivos quando deviam reagir com energia; não têm nunca apetite e percorrem cem quilómetros para comer um bife requentado num ambiente exótico ou numa sala cheia de lacaios fardados; não gostam de música e envolvem-se em ruídos enervantes, em sinfonias caricaturais; não amam a boémia nem o vino e embriagam-se por intolerância de si mesmos.
Agustina Bessa-Luís (O Sermão do Fogo)
Porque estar sozinho era bem melhor do que ser rejeitado, deixado ou abandonado.
Laura Kaye (Love in the Light (Hearts in Darkness, #2))
E pedes-me que volte, chegas a gritar "Volta, Nuno, volta"? Farias melhor se te calasses, Teresa: eu nunca saí do mesmo sítio nem nunca deixei de ser eu, desde o princípio. O que estranhas é que deixei de corresponder às expectativas dos outros para me debruçar nas minhas reflexões e isso, que significa, na pior das hipóteses, preocupação, pode, para os outros, representar cobardia, loucura ou desistência. Agora grito eu: deixa-me, deixem-me, preciso de estar sozinho! Desejo a felicidade de sofrer em paz -- e vai roendo o osso deste paradoxo, se não tens que fazer -- pelo que peço a colaboração dos amigos, e a tua, no sentido de não me importunarem até que possa renascer para a vida e para o Mundo com todos os relógios da minha interioridade acertados e a trabalhar -- é pedir de mais?
Rira Ferro
Torna-se preciso sentir. Entender o que sua sensibilidade deseja, o que sua alma precisa, para direcionar suas escolhas em qualquer setor de sua vida. Esse caminho você terá de percorrer sozinho. Ninguém terá capacidade para sentir o que seria bom na sua vida. Em sua busca pessoal, você pode colher informações, dicas de experiências de pessoas vencedoras, ler bons livros, inspirar-se, tudo isso pode somar, ajudar, mas o fator determinante de suas escolhas deve ser sempre o que você sente, o que faz sentido para o seu espírito. Porque só você tem capacidade para explorar o seu mundo interior, só você tem o dom de aprofundar-se no mar, nem sempre calmo, de suas necessidades íntimas e descobrir o ponto de equilíbrio. Trabalhar para essa conquista vale a pena. Trata-se da conquista da sua paz, do seu progresso, da sua felicidade. Pode haver alguma coisa mais importante em sua vida? Olhe
Zíbia Gasparetto (Vá em frente!)
(...) no fundo, não se saber o que se deve querer é normal: Nunca se pode saber o eu se deve querer porque só se tem uma vida que não pode ser comparada com vida anteriores nem retificada em vidas posteriores. É melhor ficar com Tereza ou ficar sozinho? Não há forma nenhuma de se verificar qual das decisões é melhor porque não há comparação possível. Tudo se vive imediatamente pela primeira vez sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que vale a vida se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? É o que faz com que a vida pareça sempre um esquisso. Mas nem mesmo "esquisso" é a palavra certa, porque um esquisso é sempre o esboço de alguma coisa, a preparação de um quadro, enquanto o esquisso que a nossa vida é, não é esquisso de nada, é um esboço sem quadro.
Milan Kundera (The Unbearable Lightness of Being)
O inferno não são os outros, pequena Halla. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exatamente em ti. Ser-se pessoa implica a tua mãe, as nossas pessoas, um desconhecido ou a sua expectativa. Sem ninguém no presente nem no futuro, o indivíduo pensa tão sem razão quanto pensam os peixes. Dura pelo engenho que tiver e perece como um atributo indiferenciado do planeta. Perece como uma coisa qualquer.
Valter Hugo Mãe (A Desumanização)
O inferno não são os outros, pequena Halla. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exactamente em ti. Ser-se pessoa implica a tua mãe, as nossas pessoas, um desconhecido ou a sua expectativa.
Valter Hugo Mãe~
Sozinho Eu sou um homem sozinho Sozinho eu sou uma boa pessoa Sozinho eu sou uma má pessoa Sozinho eu sou um monstro Sozinho eu sou um idiota Sozinho sou um intelectual Sozinho eu me divirto Sozinho eu choro Sozinho eu brinco Sozinho eu sou feliz Sozinho eu me sinto triste Sozinho eu flerto com ideias suicidas Sozinho eu escrevo poemas Sozinho eu contemplo o universo Sozinho eu questiono deus Sozinho eu sou deus Sozinho eu sou meu próprio deus Sozinho eu deleito-me em música erudita Sozinho eu me desbundo em rock n’ roll como se não houvesse o amanhã Talvez não há Pois apenas sozinho eu posso ser eu mesmo. Apenas sozinho eu posso gritar por janelas vazias ‘’ QUEM SOU EU?’’ E ao observar a imensidão do cosmos, eu encontro a mim mesmo E finamente entendo que eu sou apenas um sozinho
Gerson De Rodrigues