Cobra Verde Quotes

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A sombra das roças é macia e doce, é como uma carícia. Os cacaueiros se fecham em folhas grandes que o sol amarelece. Os galhos se procuram e se abraçam no ar, parecem uma única árvore subindo e descendo o morro, a sombra de topázio se sucedendo por centenas e centenas de metros. Tudo nas roças de cacau é em tonalidades amarelas, onde, por vezes, o verde rebenta violento. De um amarelo aloirado são as minúsculas formigas pixixicas que cobrem as folhas dos cacaueiros e destroem a praga que ameaça o fruto. De um amarelo desmaiado se vestem as flores e as folhas novas que o sol pontilha de amarelo queimado. Amarelo são os frutos novos que secaram ao calor demasiado. Os frutos maduros lembram lâmpadas de oiro de catedrais antigas, fulgem com um brilho resplandecente aos raios do sol, que penetram a sombra das roças. Uma cobra amarelas – jma “papa-pinto” – acalenta o sol na picada aberta pelos pés dos lavradores. E até a terra, barro que o verão transformou em poeira, tem um vago tom amarelo, que se prende e colore as pernas nuas dos negros e dos mulatos que trabalham na poda dos cacaueiros. Dos côcos maduros se derrama uma luz doirada e incerta que ilumina suavemente pequenos ângulos das roças. O sol que se filtra através das folhas desenha no ar colunas amarelas de poeira, que sobem para os galhos e se perdem além, por cima das folhas mais altas. Os juparás, macacos plantadores de cacau, pulam de galho em galho, numa algazarra, sujando o oiro dos cacaueiros com seu amarelo fosco e sujo. A “papa-pinto” desperta, estira seu dorso cor de gema de ovo , parece uma vara de metal que fosse flexível. Seus olhos amarelos de cobiça fitam os macacos que passam, bando buliçoso e alegre. Caem gotas de sol através dos cacaueiros. Vão rebentar em raios no chão, quando batem nas poças de água lhe dão um colorido de rosa chá. Como se houvesse uma chuva de topázio caindo do céu, virando pétalas de rosa chá no chão de poeira ardente. Há todos os tons de amarelos na tranquilidade da manhã nas roças de cacau.
Jorge Amado (São Jorge dos Ilhéus)
Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele recebeu chegando aqui: ela era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas da fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que se não torce a nenhuma outra planta; era o veneno e era o açúcar gostoso; era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre feridas com o seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do corpo dele, assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias, para lhe cuspir dentro do sangue uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela música feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantáridas que zumbiam em torno da Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa fosforescência afrodisíaca.
Aluísio Azevedo (O Cortiço)
Eu gostei daquele dia, embora viajássemos lentamente, embora estivesse frio e embora chovesse. A estrada em que percorremos era um tanto nua, plana e sem árvores. Estreitos canais viscosos margeiam a estrada como cobras verdes meio entorpecidas. Salgueiros aparados ladeavam campos planos, cultivados como hortas. O céu também era monotonamente cinzento, a atmosfera estava estagnada e úmida. Ainda em meio a todas essas coisas deprimentes, a minha imaginação florescia e o meu coração estava banhado pelo sol. Estes Sentimentos, no entanto, foram bem reprimidos pela secreta, porém constante consciência da incessante ansiedade que espreitava o meu prazer, como um tigre agachado numa selva espreita sua vítima. A respiração do predador não me saía dos ouvidos. O seu coração, feroz, batia ofegante junto ao meu. Ele não se mexia em seu covil, mas eu podia senti-lo. Eu sabia que ele esperava apenas o pôr do sol para saltar, enraivecido, de sua emboscada.
Charlotte Brontë (Villette Volume 4 of 4)
24 de dezembro [1941] A árvore, embora atarracada, não ocupa muito espaço – um canto de sala, o canto menos acessível, do qual foi removido o musgoso vaso com espadas-de-são-jorge, que alem de decorativas, segundo Felicidade, nos protegem do mau-olhado. O chacareiro queria um dinheirão por um pinheirinho de seis palmos, Luísa descalçou a bota na loja de novidades. Trouxe-a embrulhada em papel pardo como volumosa sombrinha, e armá-la foi uma operação fácil e divertida. — Veja! – e Luísa exibiu-a, eriçada como um imenso paliteiro. Meus olhos se anuviaram – as invenções deviam ter limites. A imitação infunde desprezo, mudo desprezo, a quem amou as árvores do Trapicheiro, ardentemente esperou por elas e substituiu o amor e a espera pela saudade. É duma substância assim como o celulóide, lustrosa como escama de cobra, dum verde horripilante, com frutinhos vermelhos, na ponta dos galhos, que lembravam os olhinhos dos ratos-brancos, que Pinga-Fogo criava e trazia ao ombro, sob o nojo e a reprovação de Mariquinhas, tão artificial quanto o mito que propaga. Não pus na sua ornamentação, bastante carregada, com um odioso cometa no cimo, os meus dedos descrentes, tão hábeis para respingar pela ramaria antiga as velinhas multicores, as lanterninhas, o algodão como se fosse neve. Deixei a tarefa para as mãos de Luísa e das crianças, neófitas aranhas, que alegremente se emaranhavam na teia de fios prateados que espalhavam pela galharia dura e simétrica. Quando ficou pronta, e ao pé dela as crianças plantavam os ávidos sapatinhos, Luísa perguntou radiante: — Não ficou linda? (Não destruamos as ilusões dos amadores. Pelo menos algumas. Que culpa têm de que o tempo prático e mercantil ofereça um material tão reles e sem seiva?): — Sim, está muito bonita. — E serve para muito tempo! (Ó desalentadora durabilidade!): — É ótimo. E a sensação me invade, não sei se de tédio ou de derrota.
Marques Rebelo (A Mudança)